CAVALEIROS DO NORTE!! Batalhão de Cavalaria 8423, última guarnição militar portuguesa nas terras uíjanas de Quitexe, Zalala, Aldeia Viçosa, Santa Isabel, Vista Alegre, Ponte do Dange, Songo e Carmona! Em Angola, anos de 1974 e 1975!

segunda-feira, 31 de agosto de 2015

3 238 - Último dia de Agosto e Cavaleiros do Norte em Luanda

Cavaleiros do Norte da CCS: os furriéis milicianos José Augusto Monteiro e 
Brogueira Dias e os 1ºs. cabos Miguel Teixeira e Vasco 
Vieira (de pé) e João Pires (em baixo)


Furriéis milicianos da 2ª. CCAV. 8423, a
de Aldeia Viçosa: António Rebelo,  Amorim
Martins, Abel Mourato e Mário Matos


Luanda, 31 de Agosto de 1975, há 40 anos!!! É domingo e dia, por isso, de mais uma jornada de «férias» dos Cavaleiros do Norte. Quem está de serviço, paciência..., tem de se manter pelo Grafanil e pelas instalações do extinto BIA - onde estão aquartelados!!! 
Via SPM 1246, recebi carta do meu amigo Alberto Ferreira, que até dias antes fôra cabo especialista da Força Aérea na Base Aérea de Luanda: «Vim num lugar da tripulação. Como tal, fiz a maior parte da viagem de pé, mas o que interessava  era sair daí (...). Isto não esta grande coisa. mas parece-me que sempre é melhor que aí. Que dizes?». Acrescentava o Alberto Ferreira, amigo que, infelizmente, já partiu dos vivos, vítima de doença: «Tu, pelo que sei, parece-me que também estás a dar as últimas. Pois vem o mais rápido possível...».
Já estávamos, realmente, a dar as últimas, faltando saber o dia da viagem, A cidade de Luanda, sem abastecimentos (ou sem abastecimentos suficientes...) continuava semeada de dúvidas e de medos. Reinava o MPLA, o únicos dos três movimentos que lá continuava e integrava o Governo, depois da saída de FNLA e UNITA e de Portugal ter suspendido o Acordo do Alvor. MPLA que, em comunicado do seu Departamento Político, que cito do Diário de Lisboa, dizia que continuaria a desempenhar os seus deveres governativos «na luta contra o imperialismo e para a reconstrução nacional». E que, sendo o único movimento em Luanda, «assumiria a total responsabilidade governamental no dia 11 de Novembro» - o dia da declaração da independência.
«Nós, o MPLA, repetimos uma vez mais ao 
Carta do amigo Alberto Ferreira, já
depois do regresso de Angola, dando conta,
há 40 anos, de como estava a situação
em Portugal.
«(...) Vem o mais rápido possível», dizia
o então já ex-cabo especialista
da Força Aérea
Governo português, que o povo angolano não abdicará dos seus direitos e não hesitará em os defender pela força das armas», concluía o comunicado do movimento de Agostinho Neto.
Lopo do Nascimento, dirigente do MPLA, chegava nesse dia de Lisboa - onde admitiu acordo com a UNITA e não poupou a FNLA: «O fascismo em Angola significa fundamentalmente a FNLA, quer pela sua prática política quer pela sua ideologia». O movimento presidido por Holden Roberto era também acusado de «veicular a intervenção estrangeira», que, sublinhou Lopo do Nascimento, «era preciso travar», nomeadamente «a rota através da África do Sul, que é facto consumado, e do Zaire».

domingo, 30 de agosto de 2015

3 237 - Invasão sul-africana e FNLA acusada de «canibalismo»!!!!

Cavaleiros do Norte no Quitexe. Atrás, NN, Canhoto, Miguel, NN (mecânico), Gaiteiro 
e NN. A seguir e à esquerda, Picote (mãos nas ancas e a rir), Teixeira (pintor), 
NN (parece o Pinto, o atirador), Serra (mãos no cinto), NN (a sorrir), 1º. sargento 
Aires (de óculos). alferes Cruz (camisola branca), Frangãos (o Cuba), furriel Morais (de 
óculos e a rir), Joaquim Celestino, NN (de braços cruzados, condutor),  NN (condutor 
e mãos na cintura) e Vicente. À frente, Teixeira (estofador), Marques 
(Carpinteiro), Madaleno (atirador) e Esgueira (?) 


Notícia do Diário de Lisboa sobre o
avanço de tropas sul-africanas sobre a cidade
de Sá da Bandeira, depois de Pereira d´Eça e
General Roçadas
Sábado, 30 de Agosto de 1975! O MPLA denuncia a ocupação militar de Pereira d´Eça, por forças sul-africanas. A cidade fica(va) a 40 quilómetros da fronteira e havia «indícios seguros de que aviões e helicópteros da África do Sul estariam ajá a sobrevoar General Roçadas».
As forças eram constituídas 800 homens, «entre os quais alguns mercenários portugueses da ex-PIDE/DGS e ex-comandos moçambicanos», apoiados, segundo o Diário de Lisboa (que citamos), por «meios militares sofisticados, tais como carros blindados, obuses de longo alcance, etc.».
O objectivo seria alcançar Sá da Bandeira, atacando no caminho uma base da Swapo. O MPLA,  partir de Brazaville, apontava o dedo às autoridades políticas e militares portuguesas, frisando «a responsabilidade que lhes cabe ainda na direcção do país, até à proclamação da independência». E citava recentes palavras do presidente Agostinho Neto: «O MPLA não pode aceitar que o país seja dividido em pedaços. Apenas o MPLA pode garantir a integridade territorial e a unidade da população de Angola».
A suspensão do Acordo do Alvor, anunciada pelo Alto Comissário Ferreira de Macedo (interino) e que, na prática, conduziu ao fim do Governo de Transição de Angola, não foi aceite pelo movimento de Agostinho Neto e, há precisamente 40 anos, a situação indiciou uma iminente ruptura com o Governo Português, acusado, num comunicado publicado em Luanda, de «a coberto de uma falsa neutralidade (...) permitir que o nosso pais seja invadido pelo exército do Zaire e pelo da África do Sul». Este, a sul (como acima se fala); aquele, a norte, nas províncias do Zaire e do Uíge. O «nosso» Uíge!
O mesmo Governo, sublinhava o comunicado do MPLA, que «assistiu impassível os crime atrozes perpetrados pela FNLA e pela UNITA». De ter consentido «o assassínio em massa de angolanos, torturados até à morte, violados e espancados, até os canibais imperialistas se sentirem satisfeitos» - acusação (de canibalismo) que repetia relativamente à FNLA.

sábado, 29 de agosto de 2015

3 236 - Fim do Governo de Transição e evacuação de refugiados

Quitexe. A avenida, ou Rua de Baixo, onde se centralizavam as instalações dos Cavaleiros do Norte. A seta cor de laranja indica o bar dos praças e o  coberto (agora emparedado) onde eram dadas as aulas regimentais. A enfermaria funcionava no edifício indicado pela seta verde


Notícia sobre o fim do Governo de Transição de
Angola,a  29 de Agosto de 1975, hoje se fazem 40 anos

A 29 de Agosto de 1975, «caiu» o Governo de Transição de Angola e, em Lisboa, foi anunciado o fim de Vasco Gonçalves. As funções, em Luanda, foram assumidas, na íntegra. pelo Alto Comissário Interino, general Ferreira de Macedo - que, no dia, falou ao país através da Emissora Oficial.
O Governo de Transição tinha sido formado pelos três movimentos e Portugal, nos termos do Acordo do Alvor - que Portugal já denunciara e que, na prática, deixara de existir (o Governo) no princípio do mês de Aquando, quando FNLA e UNITA foram expulsos de Luanda.
A 27, o Presidente Costa Gomes tinha solicitado apoio aos Estados Unidos, para a evacuação dos portugueses que desejassem viajar para Lisboa e que, ao tempo, se multiplicavam no aeroporto de Luanda - onde, religiosamente, todos os dias eu ia, à procura de conterrâneos e familiares. 
O Presidente Gerald Ford não respondeu de imediato a Costa Gomes, embora, segundo o Diário de Lisboa, «em princípio estivesse de acordo em conceder a ajuda solicitada». Aparentemente, segundo o DL, o Governo americano não avançava decisões sem que Vasco Gonçalves saísse do Ministério português. Os americanos estariam dispostos a colaborar, caso «existisse em Portugal um Governo com que fosse possível trabalhar».
Os Estados Unidos, na verdade, e segundo o funcionário da sua Secretaria de Estado, citado pelo New York Times, consideravam Vasco Gonçalves «um aliado dos comunistas». Robert Ingerssol, o Secretário de Estado Adjunto de Henry Kissinger, sublinhava que «a situação angolana permanente dramática e trágica, mas ainda não é sangrenta, pelo menos no que respeita aos refugiados portugueses».
A UNITA, a 29 de Setembro de 2015,
não dava como terminado o Governo
de Transição de Angola
No mesmo dia 29, mas em Lisboa, a UNITA desmentia o fim do Governo de Transição. O 1º. ministro José Ndele, do GT e militante da mesma UNITA, afirmou que «o Governo de Transição existiu sempre». As condições, disse, «é que não permitem que toda a gente possa estar no lugar das suas funções». 
«Quando ainda podemos dialogar, é preferível entrarmos em diálogo», disse José Ndele.
A França de Valery Giscard d´Estaing, entretanto, já decidira ajudar a evacuação dos refugiados e iria dar início a voos diários, com refugiados e a partir de Luanda. O presidente francês havia pedido ao seu Governo que «intensificasse a sua assistência a Portugal, naquele sentido». A Cruz Vermelha e o Governo da da Alemanha decidiram mandar para Angola uma ambulância, depois de «já terem doado aos refugiados tendas de campanha, cobertores, macas e equipamentos de primeiros socorros».
Os Cavaleiros do Norte, em final de comissão e continuando como unidade de reserva da Região Militar de Angola, contavam os dias para o regresso - cuja data, porém, ainda desconheciam.

sexta-feira, 28 de agosto de 2015

3 235 - Notícias (poucas) do Uíge e fuzilamentos públicos em Luanda

Quitexe, a casa dos furriéis e da secretaria da CCS (as três portas da direita, 
última a do gabinete do capitão António Oliveira,
comandante da 
CCS). À esquerda, vê-se a torre da Igreja


O Diário de Lisboa de 28 de Agosto
de 1975 noticiava a iminente invasão
de Pereira d´Eça por forças militares
sul-africanas

Aos 28 dias de Agosto de 1975, hoje se completam 40 anos, Luanda acordou com a informação de iminente invasão do território angolano, por forças da África do Sul. «Continuam a violar o território angolano e ameaçam invadir a cidade de Pereira d´Eça, depois de terem destruído completamente um centro populacional civil», lia-se no Diário de Lisboa desse dia, citando um comunicado do MPLA.
A 21, ainda segundo o movimento liderado por Agostinho Neto, «invadiram Angola, a partir da Namíbia e através do posto fronteiriço de Santa Clara, povoação que foi completamente arrasada». No dia 26 do mesmo Agosto de 1975, «voltaram a violar Santa Clara, prosseguindo desta vez a sua marcha através da povoação de Namacunde, em direcção a Chieve, ameaçando ontem invadir Pereira d´Eça, capital do Cunene, distrito controlado pelo MPLA».
«O que acontece neste momento na fronteira sul (...), não difere, na essência, do que vem acontecendo na fronteira norte, nas províncias do Zaire e do Uíge», sublinhava o comunicado do MPLA, em «clara alusão às ingerências da República do Zaire nos assuntos internos angolanos». 
O MPLA também chamava a atenção das autoridades políticas e militares portuguesas para, e cito o DL de 28 de Agosto de 1975, «as responsabilidades que ainda lhe cabem na condução conjunta do país» e ainda protestava junto das autoridades da República Sul Africana para «esta violação e agressão (...), exigindo a retirada imediata de quaisquer efectivos militares que se encontrem abusivamente em território angolano».
Notícia do DL sobre o
julgamento e fuzilamentos
de Luanda. Há 40 anos!
Luanda, por onde os Cavaleiros do Norte continuavam (aquartelados no Grafanil), foi cenário para, no bairro do Sambizanga, do primeiro julgamento de militares do MPLA. na verdade, «seis elementos das FAPLA, foram ontem condenados por um tribunal popular e executados». Eram acusados de «violarem, roubarem e assassinarem 11 pessoas». O fuzilamento foi em público.
Um ano antes, precisamente e no Quitexe, preparava-me eu para as minhas primeiras férias da jornada africana de Angola. Fazia a pequena mala de viagem, ia fazer mais um serviço (à ordem) e lá iria eu (e fui) laurear o queijo pela imensa e enfeitiçante Angola. Luanda seria o primeiro destino mas, na «ordem de operação» estavam também viagens a Gabela e Nova Lisboa (de visita a familiares e conterrâneos), Lobito e Benguela e outras localidade do sul angolano. Uma grande viagem de férias!!!

quinta-feira, 27 de agosto de 2015

3 234 - MPLA a controlar território e atrocidades da FNLA

António Cabrita e Manuel Marques, o Carpinteiro (falecido, subitamente, a 1 
de Novembro de 2011, em Esmoriz, com outro Cavaleiro do 
Norte (à direita) 
um angolano (a beber), talvez também militar


Andavam os dias de Agosto a chegar aos seus cabeceiros de 1975 e os Cavaleiros do Norte a acabar a sua jornada africana de Angola.  Que, oficialmente, terminaria a 30/31 (?), para «corresponder aos compromissos tomados com os movimentos de Libertação». Faltava saber o dia do regresso a Portugal e aos chãos das nossas terras e gentes!
A guerra continuava, um pouco por toda a Angola que se aprestava a nascer como nação independente: «As unidades militares do MPLA, controlando uma importante parte do território angolano, empenham-se agora em organizar a normalização da vida e em edificar o poder popular nas áreas libertadas».
Luanda não tinha dia em que não se ouvisse o metralhar das armas, ligeiras e pesadas - principalmente nos bairros populares, mas também nas áreas mais urbanas, a cidade branca, chamemos-lhe assim. Era um fogo de dúvidas e de medos que se vivia, muito embora, estranhamente, se circulasse na cidade no maior dos sossegos. Isto, no que diz respeito aos Cavaleiros do Norte. Por outros, e outra gente (nomeadamente a civil), não podemos falar. Por mim, passava o mais que podia pelo aeroporto, onde milhares e milhares de pessoas aguardavam a «fuga» aérea para Lisboa. 
Correio de minha mãe voltava a procurar saber de nossos conterrâneos, que faziam vida por Angola e de quem nada se sabia. E eram muitos! Várias dezenas! Várias vezes cheguei a ir à Emissora Oficial de Angola, que tinha um programa de (des)aparecidos, várias vezes repetido ao longo do dia e ajudando a localizar famílias das quais se tinha perdido contacto. Por uma qualquer razão! Não fui afortunado.
A 26 de Agosto, ontem se fizeram 40 anos, alguns jornalistas visitaram o Forte de S. Pedro da Barra - onde 600 «fnla´s» tinha resistido várias semanas e onde puderam (os jornalistas) «verificar horrores que atingem limites do suportável».
O Diário de Lisboa, que citamos, dá conta que «a três quilómetros do forte, junto a uma falésia sobre o mar, os jornalistas descobriram uma vala comum cheia de cadáveres em adiantado estado de decomposição e juncada de despojos humanos». Acrescentava o vespertino que «outros corpos, empilhados em outras valas, não puderam ainda ser exumados, visto a FNLA ter minado o terreno».

quarta-feira, 26 de agosto de 2015

3 233 - MPLA e FNLA com forças em intenso movimento

Cavaleiros do Norte da 3ª. CCAV. 8423, a de Santa Isabel. Furriéis milicianos 
Agostinho Belo, Ângelo Rabiço, José Querido, Victor Guedes (falecido a 16 de 
Abril de 1998) e António Fernandes - em cavaqueira, à porta do bar A Cubata

O MPLA, há 40 anos, aumentava a sua
zona de influência. Assim noticiava o
Diário de Lisboa de 26 de Agosto de 1975


A 26 de Agosto de 1975, o comunicado da 5ª. Divisão do Estado Maior General das Forças Armadas (Portuguesas) dava conta de que «a situação em Luanda mantém-se calma». No Caxito, também não havia alterações militares, «embora se verifique intenso movimento de forças do MPLA e da FNLA, o que faz prever a possibilidade de confrontações nas próximas horas».
Normal era também a situação no Lobito, onde começaram a ser evacuadas as forças da FNLA, por via marítima e para Santo António do Zaire. De lá também já tinha saído a UNITA - num navio de guerra e para Moçâmedes, que, curiosamente, era controlada pelo MPLA, estando a ser evacuadas as forças da FNLA  e negociada a saída da UNITA, que, segundo o Diário de Lisboa, «se haviam rendido».
MPLA e UNITA continuavam a confrontar-se nos arredores da cidade do Luso e em Nova Lisboa «a coluna militar das Forças Armadas Portuguesas que se deslocou ao Alto do Catumbela, recolheu cerca de 1200 civis que se encontravam retidos junto à fábrica de celulose, tendo regressado a Nova Lisboa sem dificuldades».
«A situação continua a evoluir a favor do MPLA, na zona centro e na região costeira de Sá da Bandeira, importante centro cafeeiro e ferroviário, desde a tarde de ontem em poder do movimento de Agostinho Neto. A FNLA e a UNITA, refere o Diário de Lisboa de 26 de Agosto de 1975, «capitularam e comprometeram-se a abandonar a cidade no espaço de 24 horas e toda a província do Huíla em 48 horas». Pereira d´Eça, Roçadas e Humbe eram outras cidades já em poder do MPLA.
«As unidades militares do MPLA, controlando uma importante parte do território angolano,  empenham-se agora em organizar a normalização da vida e em edificar o poder popular nas áreas libertadas», noticiava o Diário de Lisboa.
Os contactos entre dirigentes do MPLA e da UNITA continuavam, na perspectiva de «eventualmente levar ao estabelecimento de uma plataforma de entendimento entre os dois movimentos». Uma anterior reunião tinha fracassado, mas, citando a imprensa desse dia, «continua de pé a possibilidade da sua realização, a qual poderá concretizar-se nos próximos dias, quer em território angolano quer mesmo em Lisboa».

terça-feira, 25 de agosto de 2015

3 232 - FNLA a ser rearmada através do aeroporto de Carmona

O furriel Viegas em Nova Lisboa, com a Família Neves: Saudade, Fátima, 
Idalina, Viegas e Valter. Rafael Polido, o pai, à frente. Há 40 anos, a dúvida 
era saber do que era feito desta gente

MPLA e UNITA, há 40 anos, mantinham a
janela aberta para acordos. É o que se conclui da
notícia do Diário de Lisboa de 25 de
Agosto de 1975

A 25 de Agosto de 1975, as forças armadas portuguesas abandonaram definitivamente Santo António do Zaire, chegando «sem incidentes» a Luanda, dois dias depois». Soube-se, por esse tempo, que o encontro entre MPLA e UNITA, previsto para o dia 21, não se tinha realizado porque os homens de Jonas Savimbi consideraram haver falta de protecção. Ter-se-ia realizado na Base Aérea 9, em Luanda, e, no ar, ficava a probabilidade de se realizar em Lisboa.
Angola continuava em guerra e um dirigente do MPLA, citado pelo Diário de Lisboa, admitia que «durará pelo menos mais dois ou três anos». Mas, assegurava, «venceremos no terreno». Os combates «prosseguiam diariamente, entre os movimentos rivais, sem nunca se encontrar um vencedor definitivo».
O MPLA, apesar dos desmentidos dos Estados Unidos, garantia que aviões Skymaster «estariam a realizar um vaivém entre Kinshasa (Zaire) e Carmona (norte de Angola), onde estão concentrados importantes tropas da FNLA». Esses aparelhos, e citamos o Diário de Lisboa, «estariam a fornecer armamento, incluindo canhões de longo alcance».
O mesmo MPLA fazia constar que «200 instrutores chineses encontrar-se-iam a uns 80 quilómetros ao norte de Luanda, perto do Caxito» e que «mercenários do Zaire, Tunísia e afro-americanos combateriam ao lado da FNLA» - movimento que, por sua vez, denunciava o auxílio russo ao MPLA. «Rumores não desmentidos pelo MPLA aludem a próxima chegada ao porto do Lobito de um navio polaco transportando armas», noticiava o Diário de Lisboa . E um representante do Gabinete de Informação do MPLA, citado pelo mesmo jornal, admitia que «temos efectivamente apoio de países amigos», embora sem precisar se era, ou não, ajuda militar. Países como a (extinta) URSS, especialmente, e outros, do leste europeu.
Por mim e ao tempo, procurava notícias de familiares de Nova Lisboa, nomeadamente da família de Rafael e Cecília Neves - com quem não conseguia contactar há largas semanas. Pelo telefone e muito menos por carta. E também de Clemente Pinheiro, na Gabela - para além dos muitos conterrâneos moradores na área metropolitana de Luanda. Correio recebido de minha mãe, alarmou-me para a situação da família Neves (nossos familiares), que intensamente tinha procurado no aeroporto de Luanda, entre os milhares de refugiados que ali, dramaticamente, esperavam voo para Lisboa. Nunca os encontrei. Só na nossa aldeia, dias depois de chegar de Angola - depois de 8 de Setembro de 1975.
E, em Luanda, só soube que estava viva a família de Mário Coelho e Benedita Reis porque, na manifestação de civis em frente ao Palácio do Governo, eles apareceram em grande plano fotográfico, entre milhares de pessoas, na primeira página do jornal A Província de Angola.

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

3 231 - O 24 de Agosto de 1975 na memória de um Cavaleiro do Norte

Cavaleiros do Norte da 2ª. CCAV. 8423, a de Aldeia Viçosa: furriéis milicianos António 
Artur Guedes (atrás, de bigode, a espreitar), José Gomes (de garrafa na mão), Letras 
(com o braço no ombro do Pinto), Jesuíno Pinto e Amorim Martins (de bigode 
e a rir). Em baixo, Sebastião e Oliveira (cozinheiro)

Holden Roberto em território angolano, a
escassos 32 quilómetros de Luanda. Há precisamente 40
anos, estava no Negage e em Carmona - provavelmente
no BC12 onde se aquartelaram os Cavaleiros do Norte


Segunda-feira, 24 de Agosto de 1975. O dia foi particularmente emotivo para mim, que precisamente três anos antes perdera meu pai, falecido no Hospital de Águeda. Acordei na casa de Viana, onde vivia com o Neto e o Monteiro, com esse momento bem presente na memória e na alma. Mas sabia que nada me valia mais que a saudade!!! Lembrei-me dos conselhos que me dava, baseado na sua experiência de militar dos anos 40, e aprontámo-nos para mais um dia de tropa no Grafanil, um dia mais que riscaríamos no calendário do nosso adeus a Angola.
Luanda continuava semeada de dúvidas e medos, sob a latente ameaça de invasão da FNLA. O presidente Holden Roberto, já se sabia, estava no Negage e Carmona e, naturalmente, teria o objectivo de conquistar a capital. As suas forças continuavam no Caxito e repetiam-se incidentes.
Especulava-se sobre a aliança militar da FNLA coma  UNITA, mas, no ambiente de conspiração e intriga que se vivia, admitia-se também que, afinal, a aliança do movimento de Jonas Savimbi fosse com o... MPLA. 
O Jornal de Angola da véspera (23 de Agosto) admitia que «a reunião magna da UNITA poderá decidir oficialmente uma aliança com a FNLA contra o MPLA». Os movimentos, ainda segundo o Jornal de Angola, «estariam ambos interessados em associar-se à UNITA». Mas fontes diplomáticas citadas pelo Diário de Lisboa admitiam que «a UNITA limitar-se-á a uma aliança militar táctica».
Continuava o drama dos retornados. A 22 de Agosto, o presidente Costa Gomes pedira formalmente o auxílio dos Estados Unidos para «evacuar pelos menos 140 000 dos dos 330 000 refugiados que queriam abandonar Angola». O Diário de Luanda de 23 de Agosto, relata o livro «Segredos da Descolonização de Angola» (Alexandra Marques, 2014), noticiava a «tragédia marítima ao largo da Costa dos Esqueletos»: várias traineiras saídas do Lobito, Benguela e Moçâmedes, com centenas de refugiados, desapareceram quando demandavam o porto de Walvis Bay. De uma flotilha de mais de 20 embarcações, três ainda não chegaram ao porto da Namíbia. Apareceram dias mais um tarde, uma afundada, «após uma colisão no meio do nevoeiro», sendo os passageiros recolhidos por outra. Tinha passado 21 dias no mar e, segundo Alexandra Marques, estavam «esgotados meios mortos de sede e de fome».

domingo, 23 de agosto de 2015

3 230 - Holden Roberto no Negage em avião da Air Zaire

Grupo de Cavaleiros do Norte em festivo convívio, ainda no Quitexe. 
O momento, como se vê, era particularmente feliz


Luanda, a 23 de Agosto de 1975, soube
que Holden Roberto tinha chegado ao
Negage, num avião da Air Zaire 
A notícia maior de 23 de Agosto de 1975, em Luanda, foi a da chegada ao Negage do presidente da FNLA, Holden Roberto, num voo da Air Zaire. Chegou acompanhado de Jonhy Eduardo, que tinha exercido as funções de 1º. ministro do Governo de Transição.
A imprensa do dia falava do Uíge, que os Cavaleiros do Norte tinham deixado a 4 de Agosto: os americanos desmentiam o fornecimento de armamento «enviado a partir da Alemanha Federal para Carmona e Negage». E do «nosso» Uíge mais nada se sabia, para além de que continuava controlado pela FNLA. E que o MPLA tinha empurrado o movimento apoiado pelo Zaire para «o norte do rio Dande e na zona de Lucala, até Samba Caju»
Holden Roberto já tinha sido fotografado em território angolana, noutra ocasião e, segundo o Diário de Lisboa de há 40 anos, «não deu qualquer explicação para a sua reentrada».
Incidentes relatados do dia tiveram a ver com Sá da Bandeira, onde os três movimentos, reunidos às 16 horas da véspera, decidiram «cessar as hostilidades, recolher as forças aos respectivos quartéis, passar a cidade a ser exclusivamente patrulhada pelas nossas tropas e continuar hoje as conversações».
O dia 23 de Agosto de 1975 foi sábado e tempo de umas braçadas no mar de Luanda, a partir das praias da ilha. O grande problema era a escassez de alimentos. Um drama! Cada um dos quadros dos Cavaleiros do Norte a desenrascar-se como podia!
  

sábado, 22 de agosto de 2015

3 229 - Aviões e armas para a FNLA no Negage e a boda do Cavaleiro Letras

A Base Aérea do Negage, ainda no tempo da administração portuguesa. 
Há 40 anos, recebia equipamento militar americano para a 
FNLA, denunciava o MPLA


O Cavaleiro do Norte António Carlos Dias Letras 
casou-se há 39 anos, com Isaurinda, o grande
amor da sua vida! Fidelidade eterna!


O encontro entre dirigentes da UNITA e do MPLA, que chegou a ser anunciado para 21 de Agosto de 1975 (como ontem aqui relatámos), afinal não se realizou. «Não foi confirmado, nem desmentido», reportava o Diário de Lisboa do dia 22 do mesmo mês - hoje se passam 40 anos.
O MPLA, no mesmo dia, noticiava que «nos recentes combates na zona do Caxito terim sido abatidos elementos brancos, tidos como mercenários e provavelmente americanos»
A UNITA, por seu lado e em relação a incidentes com a tropa portuguesa, numa coluna do Luso para Nova Lisboa, apresentou «sinceras desculpas ao alto comissário interino e às Forças Amadas Portuguesas» e frisava que «está em via apurar os acontecimentos, a fim de que não se repitam mais» e também para que «os responsáveis de tais desmandos sejam punidos».  Os desmandos tinham ocorrido em Cela e Nidugo.
Ao mesmo tempo, tinham recomeçado as confrontações entre o MPLA e a FNLA/UNITA, em Sá da Bandeira. Em Luanda, o MPLA denunciava, em comunicado, «a existência de uma ponte aérea entre Kinshasa (Zaire) e o Negage, no norte de Angola, para transportar armas americanas destinados à FNLA».
«Os aviões que pousam no Negage transportam material de armamento, entre o qual canhões provenientes de bases americanas na Alemanha», frisava o MPLA. 
Notícia do Diário de Lisboa sobre
os mercenários abatidos pelo MPLA no
Caxito. Eram brancos e alegadamente
americanos
Os Cavaleiros do Norte, vale a pena recordar, continuavam aquartelados nas antigas instalações do Batalhão de Intendência de Angola VIA), no Grafanil, e não viam o dia de saber quando partiriam para Lisboa - sendo certo, ao tempo, que estávamos já no limite da jornada africana de Angola - entretanto diminuída para 15 meses.
Também não sabíamos, ao tempo e naturalmente, mas exactamente um ano depois, a 22 de Agosto de 1976, o Cavaleiro do Norte António Carlos Dias Letras subiu ao altar, embrulhando promessas e juras de amor á sua «mais que tudo» Isaurinda - ainda hoje a mulher da sua vida!
O furriel miliciano de Operações Especiais (Rangers) da 2ª. CCAV. 8423 jurou e cumpre a fidelidade de uma vida inteira!

sexta-feira, 21 de agosto de 2015

3 228 - Encontro, há 40 anos, entre dirigentes do MPLA e da UNITA

O furriel Viegas e António Cabrita na aldeia do Talambanza, imediatamente 
à saída do Quitexe, na Estrada do Café, para Carmona



Notícia do Diário de Lisboa sobre o encontro
entre dirigentes do MPLA e da UNITA, previsto para 21
de Agosto de 1975 - hoje se fazem 40 anos

A imprensa de 21 de Agosto de 1975 dava conta da realização, nesse dia, de um encontro entre dirigentes do MPLA e da UNITA. Em Luanda ou no Lobito, é que ainda não se sabia o local. Sabia-se, isso sim, é que a UNITA tinha estado reunida na véspera, em Silva Porto . mas também nada dela se sabia - «dada a falta de ligações telefónicas». 
A situação em Luanda continuava controlada pelo MPLA, mas o Diário de Lisboa desse dia dava conta de «alguns incidentes provocados pela presença de fuzileiros (portugueses) em segurança no porto» - ao tempo fustigado de greves, O MPLA quis por o porto a funcionar e os incidentes «deram lugar a nova paralisação», questão só resolvida com a intervenção d comissão de trabalhadores e do ministério de Economia.
Os Cavaleiros do Norte continuavam os seus dias no Grafanil, com muitas saídas para a cidade - aqui espreitando e vivendo os seus prazeres, embora fossem notórias as faltas de produtos alimentares. Mas sobravam os areais das praias, os banhos de mar e os bares, os gostos lúdicos - tanto quanto possível.
A FNLA continuava no Caxito. O seu exército, o ELNA, tinha avançado até perto de Quifangomdo, mas recuou 15 quilómetros - ante «uma tomada de força das FAPLA». No Lobito, segundo o comunicado da 5ª. Divisão do Estado Maior General das Forças Armadas (portuguesas), «a noite de ontem foi calma e a vida tende a voltar à normalidade». Em Salazar, «a situação mantém-se estável na cidade». A zona de confronto situava-se entre Ganda e Cacuso. No Luso, os civis começaram a ser evacuados por via aérea. Na província do Cunene, citava o MPLA, «continua a verificar-se grande concentração de efectivos e material de guerra sul-africano, junto à nossa fronteira».
Do Uíge, continuava a não haver notícias. A província da jornada africana dos Cavaleiros do Norte (tal como a do Zaire) continuava controlada pela FNLA.

quinta-feira, 20 de agosto de 2015

3 227 - Desertores da FNLA em Luanda e Cavaleiros à espera

Cavaleiros do Norte a jogar futebol. Reconhecem-se o Grácio (guarda-redes) e 
Miguel Teixeira (quarto e quinto, de pé) e o Cabrita (1º. à esquerda, em 
baixo). E os outros, quem são? Conhecem-se as caras, mas esquecem-se 
os nomes. Quem os identifica?


Notícia do Diário de Lisboa sobre
dois desertores da FNLA que foram treinados
na China, Tunísia e Zaire 
O noticiário de 20 de Agosto de 1975, em Angola, foi marcado pelas declarações de dois desertores da FNLA - Banga Lapas e Fellicien Thelfo - que, numa base do MPLA em Luanda, denunciaram, e cito o Diário de Lisboa, «os métodos a que o movimento de Holden Roberto recorre para angariar carne para canhão e das cumplicidades internacionais, chinesas, inclusive, com que conta para a sua tentativa de implantação do neocolonialismo em Angola» e também a participação de zairenses nas fileiras do ELNA.
Thelpho disse ter sido recrutado em Kinshasa, por uma patrulha do exército de Mobutu, e era comandante da FNLA, tendo denunciado a existência de uma sala de tortura na sede da FNLA do bairro do Cazenga. Teve treino militar no Zaire (na base de Kinkuzu,, durante um ano) e comandou operações de infiltração, precisamente a partir deste país.
Banga foi capturado em Luanda, vindo de Nova Lisboa, e recusou-se participar na troca de prisioneiros - entre os dois movimentos. Ficou no MPLA. No Zaire, afirmou, já tinha sido capturado uma rusga e obrigado a integrar as forças da FNLA. Teve treino militar na Tunísia e China e, no Zaire, instrutores israelitas e zairenses.
Thelpho assumiu-se como zairense e disse também «haver muitos zairenses nessas condições». E mais: «Cheguei a Luanda em nunca ter isto bases da FNLA e território angolano e sem ter aprendido o português». Acrescentou que «só podia comunicar com os angolanos que falavam lingala».
Os Cavaleiros do Norte, cada vez mas próximos do dia da partida, continuavam como unidade de reserva da RMA e praticamente reduzidos a serviços internos, nas instalações do Batalhão de Intendência de Angola (BIA), no Grafanil.

quarta-feira, 19 de agosto de 2015

3 226 - Terror, ataques, aviões e violência generalizada

Grupo de Cavaleiros do Norte da 1ª. CCAV. 8423, a de Zalala, 
comandada pelo capitão miliciano  Castro Dias

Notícias do Diário de Lisboa
sobre a resistência popular
anunciada pelo MPLA. 

Há 40 anos!!!

Aos 19 dias de Agosto de 1975, com os Cavaleiros do Norte cada vez mais próximos do seu regresso (com data ainda então desconhecida, mas que seria 8 de Setembro), Angola continuava embrulhada em incidentes, um pouco por todo o país. 
A declaração e ameaça da FNLA, que continuava no Caxito, em avançar sobre Luanda, continuava latente: 
«Agora dizem que vão trazer aviões. Contra isso tudo, contra os dólares, contra o imperialismo, contra os blindados, contra as armas que se viram contra o povo, ainda que venham de avião, nós vamos gritar bem alto: resistência popular generalizada», disse Rui Monteiro, o «mpla» que era ministro da Informação. 
«Nas zonas onde a FNLA e a UNITA impõem o seu terror, o povo não esta com eles. E nós devemos dizer a todos esses compatriotas que sofrem a opressão dos agentes do imperialismo que havemos de libertar todas as zonas ocupadas pelo inimigo do povo», declarou o «mpla» Manuel Rui Monteiro, que era ministro da Informação.
No Luso, onde as forças portuguesas «começaram a retirar», registaram-se problemas numa coluna ferroviária com meio milhar de civis, que a UNITA impediu de seguir. O mesmo aconteceu em Cela, neste caso à que se dirigia para Nova Lisboa. Aqui, mas já no dia 14 e segundo o comandante Monstro Imortal, do MPLA, «o camarada Joaquim Kapangu, do Bureau Político, foi retirado brutalmente de dentro de um avião da Força Aérea Portuguesa, que se dirigia para Luanda. por elementos da UNITA». Na mesma Nova Lisboa (actual Huambo), recordemos, Monstro Imortal  tinha denunciado «uma autentica caça a todo o militante e simpatizante do MPLA».
Mateus Neto, ministro da Agricultura do Governo de Transição, teria sido raptado e a FNLA (de que era membro do Comité Executivo) ameaçava «atacar indistintamente e em toda a parte, os responsáveis e os seus cúmplices», caso não fosse imediatamente libertado.
Assim ia Angola, há 40 anos!

terça-feira, 18 de agosto de 2015

3 225 - Cavaleiros contam os dias e FNLA retoma Lucala

Viegas, Cabrita e Cruz, três Cavaleiros do Norte da CCS na Baía de Cascais, em 
Agosto de 2015. O (furriel) Cruz faz 64 anos no dia 18. Precisamente hoje!!!

Notícia do Diário de Lisboa de
18 de Agosto de 1975: «PIDES» e
ex-Comandos ao lado da
FNLA»  e aviões franceses para
evacuar portugueses 


A 18 de Agosto de 1975, os Cavaleiros do Norte continuavam, aquartelados no Grafanil e a cortar dias no calendário, para o dia do desejadíssimo regresso a Portugal. 
A FNLA, segundo o Diário de Lisboa desse dia e «depois de mais uma tentativa gorada de entrada das suas forças em Luanda, através do Caxito e da Barra do Dande, retomou a sua posição anterior, delimitada pelo rio Dande».
Entretanto, e ainda segundo o DL, «num outro golpe de força que poderá envolver efectivos na ordem dos 10 000 homens, o ELNA logrou retomar o controlo da povoação de Lucala, posição estratégica no eixo rodoviário Luanda-Henrique de Carvalho, entre Salazar e Malanje» - onde, a 18 desse Agosto de 1975, «travaram-se violentos combates, que ainda não terminaram porque a FNLA mostra intenções de avançar até Salazar, que há mais de um mês ficou ou na posse do seu rival» - o MPLA.
A imprensa do dia dava ainda conta da possibilidade de «antigos membros dos Comandos portugueses de Moçambique, assim como agentes da ex-PIDE/DGS» estarem ao serviço da FNLA, em Nova Lisboa - cidade controlada pela mesma FNLA e pela UNITA. E que um primeiro avião francês tinha saído de Paris, em voo para Luanda, para «evacuar cidadãos portugueses para Lisboa».
O dia foi dia da comemoração dos 24 anos do furriel miliciano António José Cruz (rádio-montador), que hoje abracei na sua casa de  Santar, perto de Viseu. No último fim de semana, em Cascais (foto), tivemos ambos o gosto de almoçar com o nosso grande Cabrita e com ele fazer largas e emotivas memórias da nossa jornada africana do Uíge angolano.

segunda-feira, 17 de agosto de 2015

3 224 - Cavaleiros de Aldeia Viçosa e reconquista do Lobito

Cavaleiros do Norte da 2ª. CCAV. 8423, a de Aldeia Viçosa: furriéis milicianos 
António Carlos Letras, José Manuel Costa, António Artur Guedes e José 
Gomes. Todos a porem a leitura em dia

Notícia do Diário de Lisboa sobre
a reconquista da cidade do Lobito,
publicada no Diário de Lisboa
de 18 de Agosto de 1975

Os dias de há 40 anos eram acordados com notícias de todos os modos. A 17 de Agosto, a imprensa dava conta da possibilidade de FNLA e UNITA tentarem reconquistar o Lobito: «A situação parece deteriorar-se de novo, já que para ali  se dirigem forças dos outros dois movimentos, certamente para tentarem a reconquista».
A mesma imprensa desse dia dava conta que a UNITA estava a receber «grande quantidade de armamento através da Zâmbia, desembarcado no Luso e Silva Porto». Tais remessas incluiriam «material, pesado e possivelmente tanques». Em Nova Lisboa, segundo o comandante Monstro Imortal, «tem-se verificado uma verdadeira caça a todo o militante e simpatizante do MPLA» - que tinha sido derrotado na capital do Huambo.
Isto, foi há 40 anos!
Agora, fazem-se vésperas para o 15º. encontro do 2ª. CCAV. 8423, a de Aldeia Viçosa. Inicialmente previsto para Setúbal, com mordomia do António Letras, passou para Salvaterra de Magos, com «mão» do António Artur Guedes. Será a 26 de Setembro, no restaurante Zé do Moínho. Em Setúbal e para aquele dia, não foi possível arranjar restaurante com dimensão suficiente.
«Foi informado o Beato, grande dinamizador destes encontros, que por sua vez deu conhecimento ao capitão Cruz (a hierarquia ainda funciona!) e ao Ramalho», contou o Guedes, referindo, também, que «os camaradas estarão a receber as cartas com a indicação do local e da ementa, esperando todos nós uma adesão em força, já que alguns dos que nunca tiveram a possibilidade de comparecer aos convívios, já foram contactados via telefone, uma vez que residem relativamente perto, como seja em Lisboa, Almada, Coruche, Almeirim e Ourém».
Vai ser um festão!!

domingo, 16 de agosto de 2015

3 223 - O (iminente) ataque aéreo da FNLA a Luanda


Cavaleiros do Norte. Um grupo de furriéis milicianos da 3ª. CCAV. 8423, a de 
Santa Isabel: José Querido, Victor Guedes (falecido a 16 de Abril de 1998, de 
doença), António Fernandes, Agostinho Belo e Ângelo Rabiço


Diário de Lisboa de 16 de Agosto de 1975,
A primeira página, com a notícia do (iminente)
ataque aéreo da FNLA a Luanbda

A 16 de Agosto de 1975, um sábado, Luanda fervilhava de boatos. Nada simpáticos, ou prometedores: a crer neles, a FNLA iria atacar a capital, envolvendo meios aéreos.
O dia, por mim e pelo Neto, foi passado na ilha, com jantar marcado com o conterrâneo Albano Resende. Iríamos (e fomos) ao bacalhau do Vilela, no bairro da Cuca, mas antes passámos pelo restaurante onde trabalhava outro conterrâneo, o Neca Reis (Taipeiro) - que estava extremamente preocupado, ele que já tinha«fugido» de Úcua, quando por lá as «coisas» se precipitaram. Com a mulher e a filha.
As «notícias» davam conta que a FNLA preparava o ataque a partir do norte e que, na base aérea do Negage, já estariam vários aviões de combate os caça-bombardeiros Mirage. E alguns Skymaster, que transportariam material de guerra. Tudo para apoiar as suas forças terrestres que, há semanas, se encontravam no Caxito, a poucos quilómetros de Luanda.
A base, recordemos, tinha sido abandonada a 4 de Agosto, o dia em que todas as guarnições militares portuguesas abandonaram o Uíge, na coluna dos Cavaleiros do Norte.
Luanda era, todavia, uma cidade estranhamente calma - num tempo em que a população, no geral, era também estranhamente indiferente aos incidentes com armas de guerra que se repetiam. O mesmo acontecia no restante território. «Os confrontos armados que ainda decorrem caracterizam-se por uma possível vitória do MPLA na cidade do Lobito, depois de já ter assegurado o controlo de Benguela», noticiava o Diário de Lisboa desse dia de há 40 anos.
Um comunicado do MPLA, de 14 de Agosto, referia que «ao ataque traiçoeiro da UNITA/UPA/FNLA, perpretado na madrugada de ontem, tentando destruir o MPLA e as FAPLA, estas responderam com violência revolucionária, derrotando os inimigos do povo». Sublinhava o documento que «a partir de hoje, a gloriosa bandeira do MPLA flutua no quartel general da UNITA. O ELNA/UPA/FNLA foi destroçado e a respectiva delegação ocupada pela braço armado do povo angolano - as FAPLA».
Tal vitória, porém, não era confirmada pelas autoridades portuguesas.
Da «nossa» Carmona, a 30 e poucos quilómetros da base do Negage, nada se sabia, para além de relatos avulsos. Sabia-se, porém, que a FNLA impedia a remessa, para Luanda. de fundos das agências bancárias - o que levou (como ontem vimos) o ministro Saidy Mingas a «nacionalizar» a banca.

sábado, 15 de agosto de 2015

3 222 - O capitão do MPLA que foi GE do Quitexe

Cavaleiros do Norte na baixa de Luanda, há 40 anos. Os furriéis milicianos 
atiradores de cavalaria João Aldeagas (de pêra e bigode) e Plácido Queirós (1ª. CCAV. 
8423) e sapadores Cândido Pires (de pêra e bigode) e Luís Mosteias (CCS). 
O homem de óculos, pêra e bigode, atrás e entre Pires e Mosteias, é um civil 

Pinto e Eusébio, Cavaleiros do Norte de
Zalala que faziam anos a 15 de Agosto,
nascidos em 1952. Eusébio faleceu, de doença,
 a 16 de Abril de 2014





Os dias de Luanda, há precisamente 40 anos,  continuavam a passar e os Cavaleiros do Norte a riscá-los no calendário. Quando seria o dia do regresso? Era esta a pergunta de todos os dias, de todas as horas, enquanto, na cidade que fervilhava de vida e de incidentes, tudo parecia ser normal: até os ditos incidentes e as perseguições, o  sangue que jorrava a cada esquina de morte, os medos que se semeavam a cada momento do dia, principalmente durante as noites que escondiam traições.
Por um destes dias de Agosto de há 40 anos, achámos (eu e o Neto) um ex-comandante de um dos Grupos de GE do Quitexe. Foi na avenida D. João II, onde a FRAL (a fábrica da Família Neto, em Viana) tinha escritório e o nosso ex-comandado era agora capitão do MPLA .
Alberto Ferreira, João Pinto, Francisco
Madaleno e João Marcos, Cavaleiros do
Norte do PELREC. O Pinto faz 63 anos a
15 de Agosto de 2015

«Subi nos vida!... Tás a ver, esfurrié...», contou-nos ele, com o sotaque tipicamente angolano, a ferver de orgulho e apontando-nos os galões de capitão, a brilhar de 
novos. Tinha subido, na verdade, mas não mais soubemos dele.
A cidade estava controlada pelo MPLA e as tropas portuguesas seguiam a sua missão de neutralidade. Queira isso, ao conhecimento de hoje, dizer o que queira dizer.
Nogueira, condutor
do Liberato, 64
anos a 15 de
Agosto
de 2015
Ao tempo, e com os dias a serem cortados no calendário - não tão rapidamente quanto nós desejaríamos... -, a vida ia relativamente calma entre os Cavaleiros do Norte. Três deles, pelo menos, fizeram 2 anos nesse agora distante 15 de Agosto de 1975: os furriéis milicianos atiradores da Cavalaria Manuel Pinto (de Penafiel e agora em Paredes do Porto) e Eusébio Manuel Martins, de Belmonte e falecido a 16 de Abril de 2014, vítima de doença. Ambos da 1ª. CCAV. 8423, a de Zalala. E João Augusto Rei Pinto, atirador do PELREC e Cavaleiro do Norte do PELREC (no Quitexe), agora morador em Corroios. Da companhia do Liberato, o condutor José Luís Nogueira da Costa - um anoa mais velho, nascido em 1951.

sexta-feira, 14 de agosto de 2015

3 221 - Bichas nos bancos, restaurantes e postos de abastecimento

A capela católica do Campo Militar do Grafanil, nos
 arredores de Luanda. Foto de Jorge Oliveira (1973)

O MPLA foi convidado a retirar de Luanda,
há precisamente 40 anos para ali criar uma
zona de paz, que permitisse a recepção de
refugiados em melhores condições

A falta de alimentos era dramática por estes dias de Agosto de 1975, em Luanda. As bichas eram enormes, às portas dos restaurantes - que apenas serviam parte dos clientes. A rede de reabastecimentos não funcionava. Ou funcionava mal.
As bichas eram idênticas nos postos de abastecimento de combustíveis e às portas dos bancos, onde centenas (ou milhares) de pessoas tentativa levantar dinheiro. O ministro Saidy Mingas (das Finanças) tinha decretado o condicionamento de saques, para «evitar a fuga de capital».
Confirmava-se a notícia de que o MPLA tinha sido contactado no sentido de  «retirar de Luanda, com o intuito de ali criar uma zona de paz, que permitisse a recepção de refugiados em melhores condições».
A ideia era simpática, mas o movimento de Agostinho Neto não foi na «conversa», opondo-se e alegando que «os outros movimentos continuam a dominar várias cidades do país, sem que a sua retirada tenha ainda sido exigida». 
No Lobito, travavam-se combates desde as 5 horas da manhã e «as últimas informações indicavam que o resultado da luta parecia tender para o o lado das forças da FNLA e da UNITA», que combatiam o MPLA. A cidade estava «virtualmente paralisada, sem abastecimento de água e de luz».
Em Nova Lisboa, continuava «a retirada de 30 000 refugiados portugueses, completando-se também a evacuação dos membros das FAPLA, bem como cerca de 2000 militantes do MPLA». Um deles era o ministro Manuel Rui, que seguiu para Luanda. Outros, para Benguela, onde «após violentos combates entre o MPLA e a UNITA, o primeiro destes movimentos ficou em inteira posse da cidade».
Em Kinshasa, Luís Ranque Franque, presidente da FLEC - que tinha declarado a independência do Enclave a 1 de Agosto - nomeou um governo no exílio, formado por 17 elementos. Um mês antes, um Governo Revolucionário tinha sido anunciado por Nzita Henriques Tiago, que era vice-presidente da mesma FLEC. Não foi reconhecido por Luís Ranque Franque e Cabinda nunca chegou a ser independente.
Um ano antes, o comandante Carlos Almeida e Brito esteve no Comando do Sector do Uíge, em Carmona, para contactos operacionais, e «fizeram-se remodelações temporárias do dispositivo, com vista a garantir a eficiência das actuais missões primárias das NT»: a segurança dos centros urbanos e a liberdade dos itinerários.
No mesmo dia 14 de Agosto de 1974, no Quitexe, reuniu a Comissão Local de Contra-Subversão - repetindo as de 1 e 9 e antecedendo as de 21 e 29 de Agosto. Continuavam os arranjos da rede estradal, executados pela JAEA e com protecção de escoltas militares.