Encontro do PELREC com combatentes da FNLA, a 4 de Novembro de 1974. Em baixo, conhecem-se o Aurélio (Barbeiro) e o furriel Viegas |
O dia 4 de Novembro de 1974 está historicamente ligado à jornada africana dos Cavaleiros do Norte do BCAV. 8423. Foi o do primeiro encontro, cara a cara, com guerrilheiros da FNLA. Na sanzala do Dambi Angola, entre o Quitexe e Aldeia Viçosa.
A 3 de Novembro de 1974, na véspera, o PELREC recebeu uma ordem de operação muito especial: sair às 4 da madrugada do outro dia para um possível contacto com guerrilheiros do FNLA.
Quem sabia dessas coisas era o Gabinete de Operações, do capitão José Paulo Falcão - que tinha contactos e informações que não sei contar. Disse eu ao furriel José Pires, o de Transmissões e de Bragança e que andava «mortinho» para participar numa operação.
«Queres ir amanhã?!», perguntei-lhe eu, provocador e entre duas Cuca´s, calmamente bebericadas no bar da messe de sargentos do Quitexe.
«P´ra onde?...», interrogou ele, ansioso e curioso.
«Depois sabes...! Depois sabes!... Quewres ir,m ou não?!», disse eu, fechando-me em copas e a «brincalhar» com o ansioso Pires de Bragança.
Eu não podia dizer. E acrescentei-lhe: «Tens de ter autorização do capitão Falcão». Acabei por ser eu a pedir e lá foi o furriel Pires, o das transmissões. Havia outro Pires, o sapador, do Montijo.
Chegámos à sanzala,
num adro imenso !
O objectivo era a aldeia (sanzala) do Dambi Angola, na Mata do Quipemba, entre Quitexe e Aldeia Viçosa. Lá chegámos, ao princípio da tarde. Pelo caminho, passámos incólumes numa vigia dos «turras» (um deles apontando-nos uma arma, de cima de uma árvore). Cairia, a tiro nosso, caso esboçasse qualquer gesto.
O Breda, condutor-auto da primeira viatura, suava frio de ansiedades, e tremia, ao passar debaixo da árvore, conduzindo o «unimog» em que eu próprio seguia. Chegámos à sanzala, num adro imenso, e os «unimogs» pararam em posições de segurança. Em prevenção da vida de cada um de nós!
Olhámos, era eu o comandante da força, e não tive(mos) medo. Se eles lá estavam, com eles falaríamos. Era ao que íamos. Levávamos grades de cerveja e tabaco, aconselhados pela Acção Psicológica. Faltava «descobrir» o inimigo, misturado entre as gentes da sanzala - crianças, adultos e idosos, todos no meio de uns e outros. Saltei do unimog, sem tirar as divisas do camuflado. Provocador, digamos:
«Sou o furriel Ranger!...».
Manias!! Nem falar!!! E avancei, passo a passo, de mãos tensas, caídas nas ancas, a direita segurando a G3.
«Posso levar um tiro..., morro aqui!..., aqui mesmo!...», sentia eu, expectante e regado de suores frios. Do cinturão, penduravam-se granadas defensivas, prontas a estourar. A G3, de resto, estava armada com o dilagrama, para o que desse e viesse e seria letal, mortalíssimo; dilagrama que eu dispararia, em qualquer caso. Um passo meu, em frente, era um passo atrás dos populares do Dambi Angola, misturados de guerrilheiros da FNLA, como viemos a confirmar.
«Boa tarde, somos amigos, vamos falar...», gritei eu, embora de bons modos e tenso, convidando-os a conversa. Eram essas as instruções. E voltei a falar bem alto, mais um passo e outro, em frente! Confesso que meio a medo.
Os «turras» e o
jantar de camarão!
Poupando palavras, confraternizámos nessa tarde. Tarde em que o grupo da FNLA soube que tinha havido uma revolução em Lisboa - sete meses antes.
Beberam os «fnla´s» cerveja da que levávamos, depois de nós bebermos. Fumaram os «CT» depois de alguns de nós. E tirámos fotografias.
Dizia o Pires, no regresso:
«Estes é que são os turras?!».
Eram. Eu (Viegas), era tratado por Veigas. Senti-me amedrontado! Eh pá..., afinal eles sabiam quem eu era.
Guardo do Pires, o seu desabafo no jantar de camarão e cerveja à farta, que ele pagou nessa noite, no restaurante do Rocha, no Quitexe. Mais ou menos isto:
«Como é que saltaste do Unimog, com aquela calma?!!!... Já sabias que eles eram turras?!».
É evidente que, ao momento, ele não sabia disso. E nas várias vezes que falámos sobre este momento, nestes 46 anos que entretanto se passaram, sempre nos divertimos com a história. Que poderia ter sido uma tragédia!!! Não foi, se calhar, porque fomos todos, começando por mim, levianamente e generosamente irresponsáveis, embora cumpridores da missão de que estávamos incumbidos. Algum tempo depois, no Quitexe, disse-me um dos angolanos desse princípio de tarde de 4 de Novembro de 1974:
«Nós espensou c´os furrié ias matá a gente...».
Eu sei que nunca matei ninguém!
Os homens do FNLA que nesse dia «achámos» estavam armados de armas de fabrico checo e chinês, com uma bala na câmara e mais meia dúzia delas num saco de plástico pendurado na cinta, feita de um cordão improvisado de arbustos secos. Há 456anos!
Parracho de Zalala, 68 anos
em Figueiró dos Vinhos!
Aurélio Patrício Parracho, soldado atirador de Cavalaria da 1ª. CCAV. 8423, a da mítica fazenda Maria João, a de Zalala, festeja 68 anos a 4 de Novembro de 2020.
Cavaleiro do Norte do 4º. Grupo de Combate, o do alferes miliciano Lains dos Santos e dos furriéis milicianos Américo Rodrigues, Jorge Barata (ambos já falecidos) e José Louro, o Parracho regressou a Portugal no dia 9 de Setembro de 1975 e fixou-se na Praia de Pedrogão, freguesia de Coimbrão, concelho de Leiria, onde residia e de onde é natural.
A 3 de Novembro de 1974, na véspera, o PELREC recebeu uma ordem de operação muito especial: sair às 4 da madrugada do outro dia para um possível contacto com guerrilheiros do FNLA.
Quem sabia dessas coisas era o Gabinete de Operações, do capitão José Paulo Falcão - que tinha contactos e informações que não sei contar. Disse eu ao furriel José Pires, o de Transmissões e de Bragança e que andava «mortinho» para participar numa operação.
«Queres ir amanhã?!», perguntei-lhe eu, provocador e entre duas Cuca´s, calmamente bebericadas no bar da messe de sargentos do Quitexe.
«P´ra onde?...», interrogou ele, ansioso e curioso.
«Depois sabes...! Depois sabes!... Quewres ir,m ou não?!», disse eu, fechando-me em copas e a «brincalhar» com o ansioso Pires de Bragança.
Eu não podia dizer. E acrescentei-lhe: «Tens de ter autorização do capitão Falcão». Acabei por ser eu a pedir e lá foi o furriel Pires, o das transmissões. Havia outro Pires, o sapador, do Montijo.
O furriel Viegas no Dambi Angola, a 24 de Setembro de 2019, 45 anos depois do histórico encontro |
Chegámos à sanzala,
num adro imenso !
O objectivo era a aldeia (sanzala) do Dambi Angola, na Mata do Quipemba, entre Quitexe e Aldeia Viçosa. Lá chegámos, ao princípio da tarde. Pelo caminho, passámos incólumes numa vigia dos «turras» (um deles apontando-nos uma arma, de cima de uma árvore). Cairia, a tiro nosso, caso esboçasse qualquer gesto.
O Breda, condutor-auto da primeira viatura, suava frio de ansiedades, e tremia, ao passar debaixo da árvore, conduzindo o «unimog» em que eu próprio seguia. Chegámos à sanzala, num adro imenso, e os «unimogs» pararam em posições de segurança. Em prevenção da vida de cada um de nós!
Olhámos, era eu o comandante da força, e não tive(mos) medo. Se eles lá estavam, com eles falaríamos. Era ao que íamos. Levávamos grades de cerveja e tabaco, aconselhados pela Acção Psicológica. Faltava «descobrir» o inimigo, misturado entre as gentes da sanzala - crianças, adultos e idosos, todos no meio de uns e outros. Saltei do unimog, sem tirar as divisas do camuflado. Provocador, digamos:
«Sou o furriel Ranger!...».
Manias!! Nem falar!!! E avancei, passo a passo, de mãos tensas, caídas nas ancas, a direita segurando a G3.
«Posso levar um tiro..., morro aqui!..., aqui mesmo!...», sentia eu, expectante e regado de suores frios. Do cinturão, penduravam-se granadas defensivas, prontas a estourar. A G3, de resto, estava armada com o dilagrama, para o que desse e viesse e seria letal, mortalíssimo; dilagrama que eu dispararia, em qualquer caso. Um passo meu, em frente, era um passo atrás dos populares do Dambi Angola, misturados de guerrilheiros da FNLA, como viemos a confirmar.
«Boa tarde, somos amigos, vamos falar...», gritei eu, embora de bons modos e tenso, convidando-os a conversa. Eram essas as instruções. E voltei a falar bem alto, mais um passo e outro, em frente! Confesso que meio a medo.
O Viegas no Dambi Angola a 25 de Setembro de 2019 |
Os «turras» e o
jantar de camarão!
Poupando palavras, confraternizámos nessa tarde. Tarde em que o grupo da FNLA soube que tinha havido uma revolução em Lisboa - sete meses antes.
Beberam os «fnla´s» cerveja da que levávamos, depois de nós bebermos. Fumaram os «CT» depois de alguns de nós. E tirámos fotografias.
Dizia o Pires, no regresso:
«Estes é que são os turras?!».
Eram. Eu (Viegas), era tratado por Veigas. Senti-me amedrontado! Eh pá..., afinal eles sabiam quem eu era.
Guardo do Pires, o seu desabafo no jantar de camarão e cerveja à farta, que ele pagou nessa noite, no restaurante do Rocha, no Quitexe. Mais ou menos isto:
«Como é que saltaste do Unimog, com aquela calma?!!!... Já sabias que eles eram turras?!».
É evidente que, ao momento, ele não sabia disso. E nas várias vezes que falámos sobre este momento, nestes 46 anos que entretanto se passaram, sempre nos divertimos com a história. Que poderia ter sido uma tragédia!!! Não foi, se calhar, porque fomos todos, começando por mim, levianamente e generosamente irresponsáveis, embora cumpridores da missão de que estávamos incumbidos. Algum tempo depois, no Quitexe, disse-me um dos angolanos desse princípio de tarde de 4 de Novembro de 1974:
«Nós espensou c´os furrié ias matá a gente...».
Eu sei que nunca matei ninguém!
Os homens do FNLA que nesse dia «achámos» estavam armados de armas de fabrico checo e chinês, com uma bala na câmara e mais meia dúzia delas num saco de plástico pendurado na cinta, feita de um cordão improvisado de arbustos secos. Há 456anos!
Aurélio Parracho |
Parracho de Zalala, 68 anos
em Figueiró dos Vinhos!
Aurélio Patrício Parracho, soldado atirador de Cavalaria da 1ª. CCAV. 8423, a da mítica fazenda Maria João, a de Zalala, festeja 68 anos a 4 de Novembro de 2020.
Cavaleiro do Norte do 4º. Grupo de Combate, o do alferes miliciano Lains dos Santos e dos furriéis milicianos Américo Rodrigues, Jorge Barata (ambos já falecidos) e José Louro, o Parracho regressou a Portugal no dia 9 de Setembro de 1975 e fixou-se na Praia de Pedrogão, freguesia de Coimbrão, concelho de Leiria, onde residia e de onde é natural.
O Parracho mora agora em Figueiró dos Vinhos, para onde vai o nosso abraço de parabéns!
68 anos em Gondomar !
O soldado António Joaquim da Rocha Soares, atirador de Cavalaria da 2ª. CCAV. 8423, festeja 68 anos a 4 de Novembro de 2020.
68 anos em Gondomar !
O soldado António Joaquim da Rocha Soares, atirador de Cavalaria da 2ª. CCAV. 8423, festeja 68 anos a 4 de Novembro de 2020.
Cavaleiro do Norte de Aldeia Viçosa, do comandante José Manuel Cruz, capitão miliciano de Infantaria, voltou a Portugal no dia 10 de Setembro de 1975 e fixou-se em Valbom, no concelho de Gondomar, onde residia e de onde é natural. Lá continua a viver (agora na Rua Miguel Bombarda) e para lá vai o nosso abraço de parabéns!
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