CAVALEIROS DO NORTE!! Batalhão de Cavalaria 8423, última guarnição militar portuguesa nas terras uíjanas de Quitexe, Zalala, Aldeia Viçosa, Santa Isabel, Vista Alegre, Ponte do Dange, Songo e Carmona! Em Angola, anos de 1974 e 1975!

sábado, 31 de agosto de 2013

1 779 - O «sô» Breda da Barosa, condutor-auto da CCS!

Viegas e Breda, em Agosto de 2013. O Breda, num jardim de Carmona, em 1975 (em baixo)

«Olha o meu amigo da tropa!...». Foi com esta exclamação e um farto sorriso, rasgado de orelha a orelha, que o Breda me olhou, à porta de sua casa, na Barosa de Leiria, ao fim de uma manhã calorenta de Agosto de 2013.
O Breda era 1º. cabo condutor da CCS, com jeep às ordens do capitão Falcão - o oficial adjunto e de operações. E de outros serviços, por exemplo na PM de Carmona, disso recordando (nós ambos) a tarde para a noite de um domingo de Junho/Julho de 1975, quando tivemos de ir ao aquartelamento da já então ex-PIDE/DGS «buscar» dois civis que tinham sido aprisionados por elementos das Forças Militares Mistas - as FMM. 
A «coisa» estava feia e o nosso impagável Breda ficou à porta da porta d´armas, com o jeep em alta aceleração, para o caso (iminente) de termos de fugir de alguma rechaçada dos homens das FMM, caso não  libertassem os dois civis.
O Breda está fixe, aposentado e com umas arritmiazitas a perturbar-lhe o coração. «Apertam-me de vez em quando...», disse-me ele, entre conversa farta, a fazer memórias dos nossos 15 meses da jornada angolana. Mas arritmias que «não preocupam muito».
Condutor e 1º. cabo, o Breda foi louvado pelo comandante Almeida e Brito, por proposta do capitão Falcão. E porquê? Porque «sempre demonstrou inexcedível dedicação pelo serviço, aliada ao maior zelo e esforço no cumprimento do seu dever, muito contribuindo para a operacionalidade das viaturas que teve distribuídas, creditando-se como militar de elevado sentido de responsabilidade».
O louvor foi publicado na Ordem de Serviço nº. 169, que frisa o facto de ser «militar educado e disciplinado, bom colaborador do seus superiores».
Ei, ó Breda, foi um gosto enorme reencontrar-te! Grande abraço!
- BREDA. Joaquim Rama Breda, 1º. cabo condudor-auto 
da CCS. Aposentado, mora na Barosa, em Leiria.

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

1 778 - MPLA em ruptura com Governo de Portugal

A 29 de Agosto de 1975, os Cavaleiros do Norte não variavam os seus dias de espera por 8 de Setembro, a data da partida para Lisboa. Em Luanda, o MPLA reagia ao anúncio do fim do Governo de Transição e do Acordo do Alvor, feito pelo Alto Comissário Interino, general Ferreira de Macedo - que, do seu ponto de vista (do MPLA) punha em causa a política portuguesa sobre Angola.
«A coberto de uma falsa neutralidade - afirmava o documento, que repescamos do Diário de Lisboa de 30 de Agosto daquele ano - o Governo Português permitiu que o nosso país fosse invadido pelo exército do Zaire e pelo da África do Sul».
«O mesmo governo - prosseguia o comunicado - assiste impassível aos crimes perpetrados pela FNLA e pela UNITA», consentindo, frisava, «o assassínio em massa de angolanos, torturados até à morte, violados e espancados até os canibais imperialistas se sentirem satisfeitos».
O MPLA retomava, com este comunicado, a a acusação da prática de canibalismo já anteriormente dirigida à FNLA e, sendo o único movimento com ministros no Governo de Transição (suspenso pelo Alto Comissário), assumia «totais responsabilidades governamentais em 11 de Novembro» - o dia anunciado para a independência.
«Nós, o MPLA, assumiremos no fim a total responsabilidade governamental. Nós, o MPLA, repetimos uma vez mais ao Governo Português quer o povo angolano não abdicará dos seus direito e não hesitará em os defender pela força das armas», assegurava o movimento presidido por Agostinho Neto - que se vê na foto, no dia da sua chegada a Luanda.
A edição DL desse mesmo dia titulava que «tropas sul africanas avançam sobre Sá da Bandeira» e noticiava que Pereira d´Eça já estava ocupada. Que «ontem, havia indícios seguros de que aviões e helicópteros da África do Sul estariam a sobrevoar General Roçadas». 
As forças sul-africanas, noticiava o DL, eram «constituídas por cerca de 800 homens, entre os quais se encontram mercenários portugueses da ex-PIDE/DGS e excomandos moçambicanos, apoiados por meios militares sofisticados, tais como carros blindados, obuses de longo alcance, etc.».

quinta-feira, 29 de agosto de 2013

1 777 - O fim do Governo de Transição de Angola

Palácio Governador, em Luanda (foto de Jorge Oliveira, de 1974) e 
notícia do fim do Governo de Transição de Angola, no Diário de Lisboa (em baixo)


A 29 de Agosto de 1975, o Alto Comissário interino de Angola determinou «a cessão do Governo de Transição», que tinha sido criado na sequência do Acordo do Alvor mas que, na prática, já não existia - desde que a FNLA e a UNITA tinham sido expulsos de Luanda, pelo MPLA, no princípio do mês.
O Alto Comissário interino era o general Ferreira de Macedo que, nesse dia, falou à população através da rádio. Duas semanas antes, já esta decisão tinha sido preconizada, embora muito contestada pela MPLA, cujos ministros, como se lê no recorte do Diário de Lisboa dessa data, «se têm mantido em funções».
Ao outro dia, em Lisboa, a UNITA desmentia um acordo de cessar fogo com o MPLA e acções integradas com a FNLA, para além de negar a participação num «governo de balcanização do país» e afirmar, em conferência de imprensa, que «o Governo de transição não acabou». A solução política, segundo José Ndele (1º. ministro) passaria por «negociações com o MPLA, com quem queremos chegar a uma solução fraternal». 
Ao tempo, segundo o DL, as conversações entre UNITA e MPLA «passavam pela troca de prisioneiros e transposição de obstáculos imediatos para a continuação do Governo de Transição». «O Governo de Transição existiu sempre. As condições é que não permitem que toda a gente possa estar no lugar das suas funções», disse José Ndele, em Lisboa.
Razões de segurança, disse, eram o motivo por que a UNITA «retirara de Luanda e não podia comparecer às sessões governamentais».  

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

1 776 - O atirador Victor Francisco...

Viegas e Vitor Francisco, em Agosto de 2013 (em cima), «achados» na Marinha 
Grande. O Francisco no Quitexe, onde integrou o PELREC da CCS, em 1974 (em baixo)



O Francisco foi soldado atirador do PELREC e dele se sabia ser da Marinha Grande. Mas o que é feito dele, o que não é, por onde anda, ou não anda? O melhor era bater-lhe à porta e aí apareceu ele, achado numa tarde de Agosto, quando regressava a casa, das compras do Modelo. O Francisco foi um bom soldado, discreto, eficiente, sem levantar ondas. Comigo fez alguns serviços de PM (ou PU), sem falhas, cumpridor, corajoso, sereno, disciplinado. Era daqueles antigos companheiros que nos ficam guardados na memória, na esperança de um dia o encontrarmos, numa qualquer esquina da vida. Foi o que aconteceu no sábado à tarde, dia 24 de Agosto deste 2013 que corre.
«Eh, Viegas, pá... quantas vezes eu me lembro da malta!!!», disse-me ele, mal o chamei, quando se aprontava a entrar em casa. Conheceu-me logo, sem eu lhe dar graça da minha graça, num jeito que o continuou a mostrar como o rapaz humilde que conhecemos há 39 anos, a sorrirem-lhe os olhos, a abraçar o antigo companheiro da jornada angolana e a lembrar «aquela malta toda...».
O Francisco está reformado, depois de uma vida a trabalhar nas fábricas de vidro da Marinha Grande, com duas breves interrupções - quando trabalhou em França. Tem uma filha e dois netos, na altura «a passar férias no Algarve». Ele não quis ir. «Estive lá o ano passado e fartei-me», contou ao blogue.
Costuma encontrar-se com o Grácio, o sapador que zelava o depósito de géneros e prometeu combinar com ele a ida ao encontro de 2014. Até lá!
- FRANCISCO. Victor José Ferreira Francisco, soldado atirador 
de cavalaria do PELREC. Aposentado, mora na Marinha Grande.
- PM. Polícia Militar.
- PU. Polícia de Unidade.




terça-feira, 27 de agosto de 2013

1775 - Justiça popular e fuzilamentos em Luanda...

GRAFANIL. Entrada do Campo Militar, foto de Jorge Oliveira, em 1973 (em cima). 
Notícia do Diário de Lisboa, sobre fuzilamentos em Luanda, em 1975 (imagem em baixo)



A 27 de Agosto de 1975, seis elementos das FAPLA - braço armado do MPLA - «foram julgados por um tribunal popular de Luanda e executados»
A notícia foi publicada na edição do Diário de Lisboa do dia seguinte, sublinhando que «o julgamento decorreu no bairro suburbano de Sambizanga, em Luanda, sendo os seis elementos das FAPLA acusados de violarem, roubarem e assassinarem 11 pessoas».
«O tribunal popular pronunciou-se contra os réus, que foram executados em público», acrescentava o DL, precisando, ainda, que «o Estado Maior General das FAPLA publicou um comunicado em que chama a atenção de todos os militantes do MPLA, sob sua autoridade, para a necessidade de cumprirem, integral e  conscientemente, as disposições contidas na lei da disciplina das FAPLA», frisando, também, que «toda a infracção a essa lei será punida com justiça e com a rigidez que ela permite e que a gravidade do caso impuser».
Os Cavaleiros do Norte, por esse tempo e cada vez mais próximos do regresso a Lisboa e às suas casas, nem saberiam destes casos. Aquartelados no extinto Batalhão de Intendência de Angola, no Campo Militar do Grafanil, cumpriam «missões de unidade de reserva da RMA» -o que, na prática, equivalia a serviços internos (poucos), caldeados de saltos à cidade de Luanda e aos ses pontos de atracção - as praias, a ilha, os bares e os restaurantes, a noite!
O dia 8 de Setembro estava cada vez mais próximo.

segunda-feira, 26 de agosto de 2013

1 774 - MPLA aumentava a zona de influência...

A fortaleza de S. Pedro da Barra, em Luanda (imagem da net). 
Notícia do DL, em Lisboa, sobre a  influência do MPLA em Angola



A situação militar de Luanda, a 26 de Agosto de 1975, estava calma e era dada como certa a formação de uma Junta Militar para assegurar a governação - com funções idênticas às do Alto Comissário. 
O MPLA controlava a situação, o que se repetia um pouco por todo o território - aumentando a sua zona de influência. Menos no norte uíjano, de onde tinham saído os Cavaleiros do Norte.
Sá da Bandeira (e toda a Huíla), Pereira d´Eça, General Roçadas e Humbe (?), Lobito, Moçâmedes caíram em poder do MPLA, por capitulação das forças da FNLA e da UNITA - que evacuaram das zonas. Os arredores do Luso eram palco de combates entre o MPLA e a UNITA. Em Nova Lisboa, uma coluna militar portuguesa deslocou-se ao Alto do Catumbela e recolheu cerca de 1200 civis, que estavam acantonados na fábrica de celulose.
O Caxito registava «intenso movimento de forças do MPLA e da FNLA», o que fazia prever confrontações.
Em Luanda, a Polícia Judiciária autorizou a visita de jornalistas ao forte de S. Pedro da Barra, de onde tinham  sido evacuados militares da FNLA. A três quilómetros, os jornalistas puderam ver «uma vala comum, cheia de cadáveres em estado de decomposição e juncada de despojos humanos». 
«Outros corpos - relatava o DL, em Lisboa - empilhados em diversas outras valas, não puderam ainda ser exumados, visto a FNLA ter minado o terreno». 

domingo, 25 de agosto de 2013

1 773 - Armamento para a FNLA, em Carmona...

O quartel do BC12, fachada principal e lado 
do Songo (em cima) e vista aérea das instalações

A 24 de Agosto de 1975, um domingo, é dia ainda mais folgado para a guarnição do 8423. Eu, voltei a «matabichar» na Portugália e de novo com o jornalista Rebelo Carvalheira. Com o Albano Resende, ia ter almoço e preparação do meu plano de ele enviar correio meu, para Portugal, durante os dias em que duraria a viagem do Niassa e até Lisboa. Eu queria aparecer de surpresa e a forma de «iludir» os 10 dias eram enviar correio nesse período da viagem marítima. O que ia combinar com ele.
Os combates, em Angola, prosseguiam diariamente e voltou a falar-se de Carmona, o feudo da FNLA, onde, segundo o MPLA e apesar de um desmentido de Washington, «aviões do tipo «Skymaster», provenientes das bases americanas da Alemanha Federal, estariam a realizar um vaivém entre Kinshasa, no Zaire, e Carmona, onde estão concentradas importantes tropas da FNLA».
Os aviões, ainda segundo o MPLA, citado no Diário de Lisboa, «estariam a fornecer armamento, incluindo canhões de longo alcance». Acrescentava o MPLA que «200 instrutores chineses encontrar-se-iam perto do Caxito», a uns 80 quilómetros de Luanda. E que «mercenários do Zaire, da Tunísia e afro-americanos combateriam ao lado da FNLA». FNLA que acusava  MPLA de receber apoio da URSS e de países do leste, desmentido pelo movimento de Agostinho Neto. 
Assim ia Angola, há 38 anos!

sábado, 24 de agosto de 2013

1 772 - Holden Roberto voltou a Carmona...

Aeroporto de Carmona, de onde, a 3 de Agosto de 1975, saíram os Cavaleiros 
do Norte. E onde, a 23 do mesmo mês, chegou Holden Roberto (FNLA)

Luanda, 23 de Agosto de 1975. Passam-se 2 anos da morte de meu pai e um sobre um das noites mais dramáticas da nossa jornada africana, na pista de aviação do Quitexe - onde o PELREC «sonambulou» medos e resistiu à tentação do ataque a uma coluna de infiltrados. Das vésperas, tinha aerograma de minha mãe - que me vinha lembrar o nosso luto e desejar-me a sorte que uma mãe viúva deseja a um filho que está na guerra, onde ele imagina todos os males e tragédias do mundo. Senti, na altura, um inexplicável conforto emocional.
Tenho encontro com o Albano Resende (com conterrâneo, civil), na Portugália, a meio da manhã, e para lá me dirijo, ido de Viana. Lá costumava «matar-o-bicho», com Rebelo Carvalheira, jornalista de A Província de Angola. É nele (jornal) que leio sobre a possibilidade de uma aliança da FNLA com a UNITA, para combater o MPLA. Os movimentos liderados por Agostinho Neto e Holden Roberto contariam, segundo o jornal, com «apoio tribal de mais de 40% da população total de Angola», pelo que cada um estava interessado na aliança com a UNITA, mas esta, e cito o PA, «limitar-se-á a uma aliança militar táctica».  
Carmona, de onde saíramos menos de 3 semanas antes, raramente era notícia, mas, em Portugal, o Diário de Lisboa desse dia, titulava que «Holden Roberto chegou a Carmona num avião da Air Zaire» - acompanhado de John Eduardo, que fôra 1º. ministro do Colégio Presidencial no Governo de Transição.
Dias antes, tinha sido fotografado na Barra do Dande e não foi dada explicação sobre a sua reentrada no território angolano - coincidente com o empurramento da FNLA, pelo MPLA, «para norte do rio Dande e do Lucala, quase até Samba Caju» - como se lê na notícia do DL.

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

1 771 - A fuga de funcionários públicos angolanos

Furriéis Aldeagas e Queirós (1ª. CCAV.), Cândido Pires e Luís Mosteias, 
sapadores da CCS, na baixa de Luanda, nos últimos dias de Angola


Os Cavaleiros do Norte, fazendo contas aos dias de calendário que os separavam de 8 de Setembro, dia previsto para a viagem marítima para Lisboa, iam espreitando os prazeres urbanos, desconhecidos para a maioria deles, mas que desafiavam os seus apetites mais carnais.
Os restaurantes e bares da baixa luandina era seu pouso habitual - pela Portugália, a Mutamba, o Paris Versailles, o Pólo Norte, o Amazonas, a Floresta, a ilha, a restinga, o Mussúlo e quantos outros sítios onde se matavam prazeres. O 8, o 23 e o 24, por exemplo!!! Ou o BO e o Marçal!!!
Os Estados Unidos desmentiam o envio de material de guerra para Carmona e Negage, a partir das duas bases europeias da Alemanha Federal. Em Kinshasa (Zaire), o secretário dos Negócios Estrangeiros da UNITA desmentia qualquer acordo com a FNLA, mas o Jornal de Angola desse dia 23 de Agosto de 1975 admitia que «a reunião magna da UNITA poderá decidir oficialmente uma aliança com a FNLA».
Lopo do Nascimento (foto), do MPLA, em Luanda, dava conta das suas preocupações sobre «o elevado número de funcionários nascidos e residentes em Angola que se inscreveram no quadro de adidos de Portugal». Considerava o facto como «inconveniente»  e frisava que os angolanos nessas condições «perderão automaticamente a cidadania angolana, passando a ser estrangeiros no país que tiverem escolhido».
«Pedimos a todos esses compatriotas que assumam as suas responsabilidades de angolanos, que aceitem os sacrifícios que as actuais circunstâncias impõem e que contribuem com o seu trabalho na luta contra a sabotagem económica pelo aumento da produção», disse Lopo do Nascimento, há 38 anos - no Verão de 1975.

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

1 770 - Os Resende´s, o MPLA/UNITA e a FNLA...

A família Resende, em Luanda, com Viegas (segundo da direita) e capitão Domingues (à 
direita). José Bernardino (de barba), com a esposa Fátima, as filhas e o irmão Albano 



A vida de Luanda, apesar de todos os incidentes inter-movimentos, era estranhamente calma por Agosto de 1975, embora os militares portugueses, pelo menos os Cavaleiros do Norte, circulassem na cidade com extremos cuidados e sempre em grupos. Assim estvam instruídos.
Já por aqui falei, várias vezes, da família Resende (meu principal ponto de encontro em Luanda), e foi Fátima (foto) quem, em Julho de 1975, me transportou para Lisboa uma aparelhagem de som (que ainda jaz ali na minha sala) e caixas de wiskye, de que sobram ainda algumas garrafas.
O Albano, pouco mais velho que eu e (anterior) vizinho de 50 metros, aqui na aldeia, fazia-me de cicerone pela cidade de Luanda e por isso a conheci tão bem. Falávamos, obviamente, da situação, mas não se lhe notava grande preocupação sobre o amanhã. Angola seria o seu futuro. Mas não foi.
Em Luanda, a 21 de Agosto de 1975, falava-se de uma cimeira MPLA/UNITA. A FNLA, na área do Caxito, tinha avançado até perto de Quifangondo, mas recuou uns 15 quilómetros, por força do MPLA. MPLA que, a 22, dava conta de que, nesses combates, tinham sido abatidos mercenários brancos, ao serviço da FNLA. «A ser verdade - relatava o Diário de Lisboa de 22 de Agosto - tal facto vem apenas confirmar diversos boatos que falam da presença de americanos e chineses na orientação das forças da FNLA que actual naquele sector».

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

1 769 - O alferes miliciano oficial de justiça e poeta...

Alferes Ramos, oficial miliciano (em cima) e poeta (em baixo)



O alferes Ramos apresentou-se no BC12 e na 2ª. CCAV. 8423 (a de Aldeia Viçosa) em Maio de 1975. Por lá fez inventário do espólio militar da guarnição, fez 63 anos a 14 de Agosto e o facto foi evocado no blogue.
«Obrigado pela atenção! Dei uma vista de olhos pelo blogue e gostei da lembrança e de ver as fotos e o respectivo ambiente!», escreveu o agora advogado Fernando Ramos, dando conta que «na altura não presenciei a saída do Batalhão de Carmona, pois, como estava ali por castigo e não estava familiarizado com o pessoal, aproveitei a primeira oportunidade para voltar de férias para Luanda, onde aliás tinha família!».
Por Carmona e nos Cavaleiros do Norte deixou rasto... poético, na edição que assinalou o primeiro ano do BCAV. 8423 em Angola, em Junho de 1975 - como se vê na imagem.
Achado de férias em Luanda, por lá ficou, com processos disciplinares e outros!
«Era eu e um furriel, cujo nome não lembro! Nem sei se ele e os processos também eram desse nosso Batalhão ou outro», conta Fernando Ramos.
Oficial de justiça, nessa altura e para esse efeito, foi-lhe distribuído um jeep Land Rover, mas como já faltavam pneus, lembra-se «os de trás, um era maior que o outro».
Os Cavaleiros do Norte começaram a regressar a Lisboa a 8 de Setembro, mas por lá continuou o oficial de justiça e poeta. «Regressei de avião, a 22 de Outubro de 1975, e permaneci no serviço de Justiça até ao Verão de 1976, num quartel perto de Sete Rios... por aí!», contou ele ao blogue.
Gostava de reencontrar o furriel que com ele lidou na justiça. «Ao ler-se o blogue, talvez alguém se lembre de quem era esse furriel!», disse Fernando Ramos.
Quem sabe?!
- RAMOS. Fernando António Morgado Ramos, alferes miliciano atirador de cavalaria. Advogado em Vila Nova de Foz Coa, onde reside.

terça-feira, 20 de agosto de 2013

1 768 - O encontro com o sô Cabrita...

Cabrita e Viegas, em 2013, em Cascais (em cima), e 1974, no Quitexe (em baixo)

É possível passar um verão sem ver o sô Cabrita? Claro que é, mas nos últimos nos tem sido inevitável achá-lo, perto da «sua» baía de Cascais - de onde sai todas as noites, mar adentro, para a faina da pesca que tem sido a sua vida. Assim aconteceu este ano!
É preciso recuar a 1974 e ao Quitexe, onde o sô Cabrita, e outros companheiros da jornada africana, por todos os santinhos queria(m) fazer a 4ª. classe, na escola de adultos, as aulas regimentais. Assim queria (o nosso companheiro Cabrita) e assim concretizou o sonho de ter diploma - que lhe era indispensável para a carta de barco.  
Já em Portugal e na sua Alvor natal fez-se ao mar e aportou a Cascais, onde tem feito vida, mai-la sua Palmira, namorada de 74 e 75, a quem eram mandadas cartas d´amor que fariam corar as mais belas e púdicas cortesãs.
Pois, neste Agosto de 2013 que corre, lá foi inevitável o encontro com o sô Cabrita, que começou regado a cerveja, pelo meio da tarde, e acabou em refastelado jantar apeixeirado e amariscado, já a noite ia adiantada. Com um telefonema, pelo meio, ao (furriel) Monteiro, apanhado em  calções na praia do Furadouro. 
O sô Cabrita está de boa saúde e mantém o jovial espírito de 1974 e 1975, sem lhe escaparem os pormenores mais ínfimos da nossa jornada angolana do Uíge. 
«Então, ó so Viegas..., e daquela vez que???!!!...», avivou ele memórias sobre os nossos dias da há 39 e 38 anos.
É este o espírito dos Cavaleiros do Norte!!!

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

1 767 - Retornados e caixotes...


Retornados de Angola à volta dos seus caixotes (fotos da net)

Angola era, por Agosto fora de 1975, uma terra regada de sangue, de Luanda para Norte, para Cabinda, para o sul, Nova Lisboa, Lobito, Benguela, para leste, para o Cunene, sabe-se lá por onde. Era um braseiro de fósforos mal apagados, uma terra de ódios ceifados a rajadas e rebentamento de granadas, morteiros e armamento pesado.   
Milhares de pessoas acamparam no aeroporto e onde calhava, à espera de uma boleia para Lisboa. Já por aqui falei das vezes que, eu mesmo, por lá procurei familiares e conterrâneos - que nunca encontrei. Era gente anónima que nada tinha a ver com a guerra que medrava e matava, mas por ela sofria. Florescia na cidade a indústria dos caixotes, nos quais os refugiados (em Portugal baptizados da retornados) acomodavam teres e haveres, em despacho para Lisboa.
Aqui, em Lisboa, a 18 de Agosto de 1975, reuniram-se os retornados na FIL; em Lisboa, em comício, com uma primeira palavra de honra: «Rosa Coutinho traidor!». Pediam «justiça para os danos que nos foram feitos» e reclamavam o regresso de Silva Cardoso a Angola - o general que era Alto Comissário.
O Instituto de Apoio aos Retornados Nacionais (IARN) abria uma delegação em Luanda, para coordenar as actividades programadas e previa que, até 31 de Outubro, as acções de retorno fariam chegar a Lisboa 300 000 mil portugueses residentes em Angola. Ou até 350 000!
Os caixotes, esses viram num programa de transporte por via marítima que previa 170 000 metros cúbicos de carga pertencente aos retornados.
De Angola, em vermelho de sangue e de ódios e raivas, chegava ao Tejo gente mártir, útil, trabalhadora, criadora, branca, negra, mestiça, de todas as cores , com uma mão adianta e outra atrás, ambas com nada.
Os Cavaleiros do Norte preparavam malas para o Niassa. Que zarparia a 8 de Setembro de 1975

domingo, 18 de agosto de 2013

1 766 - FNLA tentou reentrar em Luanda...


Holden Roberto, presidente da FNLA, em 1975, a 32 quilómetros 
de Luanda, na Barra do Dande (data desconhecida, foto da net)

A 18 de Agosto de 1975, os Cavaleiros do Norte continua aquartelados no Batalhão de Intendência de Angola, no Campo Militar do Grafanil, e sabe-se que será de lá que partirão para Lisboa, no navio «Niassa». A 8 de Setembro. Mas viria a ser de avião.
Luanda digere a manifestação da véspera, da União Nacional dos Trabalhadores de Angola )»UNTA), em frente ao Palácio do Governo, apoiando as medidas de nacionalização da banca, anunciadas por Rui  Monteiro - o ministro do Planeamento e Finanças. Ostentam cartazes: «Nada contra o povo, tudo pelo povo?, ou «Produção é uma forma de luta», ou «Produzir é resistir». 
O ministro garante-lhes que «havemos de libertar todas as zonas ocupadas pelo inimigo do povo» e manda um recado às Forças Armadas Portuguesas: «É bom que nós digamos aqui, aos soldados portugueses, que a nossa luta é igual à deles, em Portugal. Se eles são filhos do povo, têm de estar ao lado de todas as revoluções e de todas as lutas dos povos progressistas».
O território angolano continuava a ser terra de sangue.
A FNLA, citamos do DL, «retomou a sua posição anterior, limitada pelo rio Dande», depois de «mais uma tentativa gorada de entrada das suas forças, através do Caxito e da Barra do Dande», em Luanda. O seu exército, o ELNA, reconquistara Lucala, localidade por onde os Cavaleiros do Norte tinham passado dias antes e era estratégica na ligação de Luanda a Henrique de Carvalho, entre Salazar e Malange. «Aí, travaram-se violentos combates, que ainda não terminaram, porque a FNLA mostra intenções de avançar  em direcção a Salazar, que há mais de um mês ficou na posse do seu rival», relata o DL.  E tenta retomar o Lobito.
Há problemas com colunas de deslocados, no Luso (de onde as forças portuguesas começaram a retirar), Quando-Cubango, Nova Lisboa e Cela. Eu, em Luanda, procurava familiares de Nova Lisboa e Gabela, que suponha estarem no aeroporto. Nunca os encontrei, seguiram outros caminhos.

sábado, 17 de agosto de 2013

1 765 - O reencontro com o 1º. cabo Soares

Viegas e Soares no Laranjeiro (Almada), em Agosto de 2013, em cima. 
Soares (sublinhado a amarelo) e Viegas em 1974, no Quitexe, integrando o PELREC

Vinha eu a entrar em Lisboa, numa fila imensa de chegada à Ponte 25 de Abril, quando dei por uma placa que me sugeriu o Laranjeiro. No Laranjeiro mora o Soares, pelo que... nada melhor que procurá-lo. Não foi difícil chegar à rua e muito menos achá-lo. Estava a bebericar com uns amigos, a petiscar, a matar o tempo. Foi um ex-PSP de Carmona que me fez chegar a ele e, pondo-me na frente dele, não é que o Soares me reconheceu logo?
«O meu furriel Viegas!!!!...».
Exultem e exclamem a expressão com todos os decibéis e imaginem o Soares a saltar da cadeira, como que empurrado por uma mola, a pendurar-se num abraço enorme e a esfregar as mãos de felicidade. Foi assim que nos reencontrámos, abrindo conversa para um mar de recordações. E de emoções!!
Isto foi a 12 de Agosto de 2013! 
Há 35 anos e por estes dias, os Cavaleiros do Norte matavam dias do calendário, em Luanda, aquartelados no Campo Militar do Grafanil, à espera de 8 de Setembro - o dia do regresso a Portugal. 
A 16, ouvia-se por Luanda que o MPLA tinha afastado a UNITA e a FNLA do Lobito. Em Lisboa, o Presidente da República reuniu com os Chefes de Estado Maior do Exército e da Marinha, para «analisar a situação em Angola». Na véspera, o problema já tinha sido analisada com membros do Gabinete de Angola da Comissão Nacional de Descolonização, o vice-primeiro ministro (tenente coronel Arnão Metelo), o ministro dos Negócios Estrangeiros (Mário Ruivo) e o ministro da Economia do Governo de Transição de Angola, o português Vasco Vieira de Almeida - que se deslocou a Lisboa para «dar conta da gravíssima situação económica daquele território».
- SOARES. Fernando Manuel Soares, 1º. cabo de reconhecimento e informação, do PELREC da CCS o BCAV. 8423. Aposentado, mora no Laranjeiro (Almada), no 1º. andar do prédio que se vê na foto de cima.


sexta-feira, 16 de agosto de 2013

1 764 - FNLA prepara(va) ataque aéreo a Luanda?

Base aérea do Negage, no tempo da presença
 portuguesa (em cima). Capa do Diário de Lisboa (em baixo)



Agosto de 1975, dia 16. Luanda ferve de boatos e, sabe-se lá com que fundamento, vai correndo a notícia de que a FNLA prepara um ataque à cidade, a partir do norte, de Carmona (de onde dias antes tinham saído os Cavaleiros do 8423) e da base aérea do Negage.
O Diário de Lisboa chama a operação ao alto da sua primeira página e dá conta que «diversas fontes assinalam já há alguns dias, a presença de aeronaves estrangeiras fazendo escala» onde existia a base aérea portuguesa, «a qual foi recentemente abandonadas, após a retirada das FAP daquela região». E contava, ainda segundo o DL, que entre os aviões que escala(va)m o Negage, encontrar-se-iam alguns Skymaster, que «estariam a proceder ao transporte de material de guerra para a FNLA», dando-se igualmente como «certa a presença, também, de caças-bombardeiros, naquele aeroporto».
Os observadores «mais alarmistas» previam mesmo «um iminente ataque a Luanda ou, pelo menos, o apoio aéreo a uma possível tentativa para fazer avançar, a partir do Caxito, as forças da FNLA que ali se encontram numa situação de impasse,  há mais de um mês».   
Agostinho Neto, em Luanda, confirmava a possibilidade de o MPLA declarar unilateralmente a independência e o seu bureau político reagiu à decisão de o alto comissário interino continuar no governo - abandonado pelos ministros da FNLA e da UNITA. De Lisboa chegava o Comandante Contreiras, do Conselho da Revolução, aparentemente, para conversações com os órgãos responsáveis». Outros rumores chegavam de Lisboa, como o do Alto comissário Silva Cardoso não voltar a Luanda e, cito do DL, «até de certos postos de comando militar virem a ser substituídos».

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

1 763 - Pinto´s, Eusébio e Nogueira em dia de anos...

Pinto e Eusébio (1ª. CCAV. 8423, em cima), Nogueira da Costa, do Liberato, em baixo, à esquerda (com Viegas e Oliveira) e Pinto, da CCS (foto isolada). Aniversariantes de 15 de Agosto



Há pelo menos 4 Cavaleiros do Norte a festejar anos, neste 15 de Agosto de 2013: o Manuel Pinto e o Eusébio, que furrielaram por Zalala (na 1ª. CCAV. 8423), o Nogueira da Costa (que foi condutor da Companhia do Liberato) e o Pinto, atirador da CCS, no PELREC.
O Pinto zalaliano é frequentador deste espaço e sabemos que vive nas suas 7 quintas de Paredes, onde se dedica ao «vício» dos automóveis. É, de todos, quem mais tempo de tropa partilhou comigo, pois fomos contemporâneos do 2º. curso de Operações Especiais (os Rangers) de 1973, em Lamego. Ei, ó Pinto, já lá vão 40 anos, pá!!!
O Eusébio vive na sua Belmonte, aposentado do funcionalismo público e em maré de se transformar em pequeno empresário de restauração e artesanato. Foi furriel miliciano atirador de Cavalaria, formado na Escola Prática, em Santarém.
O Nogueira da Costa nasceu em Tomar, em 1951, foi bebé para Angola e lá integrou a Companhia de Caçadores - a última guarnição do Liberato. A companhia angolana (com quadros europeus) que se revoltou e quis invadir Carmona. Aposentado da Carris, divide o seu tempo entre Tomar e Lisboa - onde moram os filhos.
O Pinto, foi atirador do PELREC e dele sei que vive em Corroios.
Todos eles hoje de parabéns! Que para eles vão, com grandes abraços. 

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

1 762 - Luanda, meados de Agosto de 1975

Viana, em Angola . A estação dos Correios (foto pós-75)
Luanda, 14 Agosto de 1975. Vamos em meados o mês e cada dia é riscado no calendário dos Cavaleiros do Norte. Sabe-se que a partida (o regresso a nossas casas) será no princípio de Setembro. 
Os três furriéis «rangers» da CCS - o Monteiro, o Neto e eu (Viegas) - estão «aquartelados» na casa de Manuel Cruz, um empresário de Águeda, com fábrica na zona industrial de Viana.
Dali partem, para o Grafanil, para os serviços de ordem. Ou para Luanda, beijar a cidade e os sítios de lazer e dos prazeres que se chamam ao desejo de jovens dos 22 para 23 anos.
Por essa altura, foi conhecida uma beldade de Viana, na Estação dos Correios - ver AQUI - que muitos sonhos e desejos suscitou ao trio. Outras histórias.
Luanda vivia de incertezas, numa calma regularmente perturbada. Faltava a gasolina e era vulgar encontrar intermináveis bichas nas bombas, para se comprarem 10 litros. Bichas, viam-se também às portas dos bancos, para levantar dinheiro - o que se tornou mais difícil a partir do momento em que o ministro das Finanças, Syr Mingas, decretou condicionamentos.
A 14 de Agosto, a UNITA não tinha um único elemento em Luanda e a FNLA apenas tinha dois representantes: Samuel Abrigada e Graça Tavares.
O MPLA teria sido convidado a abandonar a capital, para ali criar uma zona de paz e melhor se poderem receber os refugiados de todo o território angolano, mas o movimento de Agostinho Neto opôs-se a tal, alegando que FNLA e UNITA dominavam outras cidades e tal não lhes era exigido.
Lobito, Benguela e Nova Lisboa eram cenário de duros combates. A FNLA e a UNITA, juntas, obrigaram as FAPLA´s a refigiarem-se nos quartéis portugueses, no Lobito. Em Nova Lisboa, é o contrário: domina o MPLA. O mesmo MPLA que, em Benguela, expulsa a UNITA. Assim ia Angola!

terça-feira, 13 de agosto de 2013

1 761 - A FNLA à volta da capital...

A messe de sargentos ficava na avenida dos Combatentes, em Luanda, num destes prédios (que já não conseguimos identificar), e lá fomos nós, a 3 de Agosto de 1975. Menos bem recebidos, pela classe que por lá se entediava e folgava vícios, sem cuidar saber das agruras e problemas que outras guarnições tinham pelo resto do território. E com isso nada se preocupar.
Éramos, para esses «residentes», uns verdadeiros ET´s, uns contra-revolucionários, fascistas e colonialistas - léxicos muitos estranhos ao nosso conhecimento de então. Mas que, bem percebíamos, eram para nos ofender.
Os Cavaleiros do Norte eram o último batalhão, em Angola, com formação militar anterior ao 25 de Abril e apontados, a dedo, como sendo colonialistas e todos os «istas» revolucionários da época. Todos estranhos à nossa disciplina. 
A retirada das tropas da FNLA e da UNITA, com o MPLA a controlar a capital, digamos que (olhando agora) marcou o colapso do Governo da Transição - Governo tripartido, envolvendo os três movimentos, para além dos representantes de Portugal. Governo que deveria conduzir Angola até à declaração de independência, marcada para 11 de Novembro.
Um despacho noticioso de Luanda, datado de 13 de Agosto e publicado no Diário de Lisboa, refere que «fontes militares portuguesas estacionadas em Luanda afirmaram que o MPLA mantém o controlo total da cidade e que o seu presidente, dr. Agostinho Neto, está agora em posição que lhe permite assumir o poder total do Governo central e declarar unilateralmente a independência»
Mas, havia alguns... mas. O mesmo despacho noticioso também sublinhava que «as forças da FNLA dispuseram-se em torno da capital, a fim de pressionar o movimento rival a fazer concessões políticas». Só que os mesmos círculos militares também indicavam que «não é ainda previsível um contra-ataque deste movimento».
Angola fervia!

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

1 760 - Dias de Luanda em Agosto de 1975...

Carlos Sucena e Gilberto Marques (dois amigos 
e Águeda), Viegas e Neto na casa da Viana, em Agosto de 1975

Os Cavaleiros do Norte chegaram a Luanda e mandou a regra que cada quadro se desenrascasse. Falamos das classes de sargentos e oficiais, sem sítio, no Batalhão de Intendência, onde pudéssemos acomodar os ossos. Cada qual teve de se desenrascar. 
Eu, o Neto e o Monteiro fomos «parar» a casa de Manuel Cruz, um empresário aguedense (amigo do Neto e que tinha deixado chave a Gilberto Marques), em Viana. Por lá ficámos até 7 de Setembro.
Os praças (soldados e cabos) arrancharam no Grafanil e cada qual, como podia, tinha as suas retiradas estratégicas para a Luanda - para a noite e a folia.
Os três movimentos de libertação - MPLA, FNLA e UNITA - continuavam a travar combates, um pouco por toda a Angola, procurando, cada qual, estabelecer controlos territoriais. 
O Diário de Lisboa de 12 de Agosto de 1975 dá conta que «mantêm-se, entretanto, as posições dos três exércitos: a FNLA, assistida pelo Zaire, está bem instalada no norte; o MPLA maioritário no centro e na costa ocidental; a UNITA, que parece aliar-se cada vez mais à FNLA, predomina no sul».
Luanda por este dia, era terra de calma. Os últimos efectivos da FNLA tinham sido retirados e o MPLA, citamos o DL, «mantém firmemente as suas posições na capita angolana». A UNITA já retirara da cidade e a 11 de Agosto, «apenas um funcionário se mantinha», mas «prestes a retirar para Nova Lisboa».
A FNLA pediu apoio das Forças Armadas Portuguesas para concluir a retirada de Luanda - o que foi  feito por via marítima. 
A notícia do DL dá conta que «começa a faltar o café, a gasolina e o tabaco, mas a vida continua a decorrer normalmente, ao passo que, no sul, a água se torna rara, a carne é difícil de encontrar e o pão inexistente».
«Ainda não se atingiu, em Luanda, o nível de alarme no capítulo do abastecimento alimentar, ao contrário do que se verifica nalgumas localidades do interior», escrevia o DL. Nós testemunhamos coisa contrária: havia falta de alimentação na cidade. Corríamos restaurantes para comer e nem sempre conseguíamos.
Estávamos por nossa conta. Deixámos de ter direito a elementar comida diária, no quartel.

domingo, 11 de agosto de 2013

1 759 - O Governo de Angola não funcionava...

Presidentes Holden Roberto (FNLA), Agostinho Neto (MPLA) e Jonas 
Savimbi (UNITA). Vasco Vieira de Almeida, ministro do Governo de Transição (em baixo)


O Governo de Transição de Angola não funcionava e era Vasco Vieira de Almeida (ao lado, no DL), ministro da Economia indicado pelo Governo de Portugal, quem isso reconhecia a 11 de Agosto de 1975, ao declarar «não saber» se a acção envolvendo os ministros da FNLA evacuados de Luanda, por tropas portuguesas, significaria  a sua queda.
As violentas confrontações de sábado anterior (dia 9), por detrás do Palácio do Governo - perto do seu gabinete, mas sem o atingir -, levaram à evacuação dos soldados da FNLA e especulava-se, ao tempo, sobre a possibilidade de as autoridades portuguesas tentarem retirar da capital as tropas dos três movimentos e declararem Luanda como zona desmilitarizada - numa altura em que o MPLA quase por completo dominava a cidade e, citando a France Press, o presidente Agostinho Neto, admitia a declaração unilateral da independência antes de 11 de Novembro - a data prevista pelo acordo do Alvor.
«Nunca se sabe, é uma hipótese. Tudo depende do comportamento das forças em presença», disse Agostinho Neto. Isto, enquanto o presidente Holden Roberto (FNLA) procura encontrar-se com Valery Giscard D´Estaing (presidente francês, no Zaire mas sem tal conseguir) e Jonas Savimbi viajava para a Tanzânia, para conversações com o presidente Julius Nyeirere.
Os Cavaleiros do Norte, no CampoMiliatr do Grafanil, faziam serviços de rotina e, cada qual como podia, «espraiava-se» por Luanda, buscando os prazeres da idade pela baixa, pelos restaurantes e bares e casas de diversão, praia e outros lugares de prazer da capital. 
Luanda, aonde chegavam milhares e milhares de pessoas em trânsito para Lisboa, na célebre ponte aérea, estava, entretanto ameaçada por outra guerra: a da fome. «Paira sobre Luanda o espectro da fome. Começam a rarear os combustíveis e a comida e não tem chegado reabastecimentos», noticiava o Diário de Lisboa, em despacho da capital de Angola.

sábado, 10 de agosto de 2013

1 758 - O comando da coluna de Carmona para Luanda

Almeida e Brito, segundo a contar da esquerda, com 
o furriel Reino, o soldado clarim Mendes e o capitão Falcão 

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ANTÓNIO A. GUEDES
Texto

A companhia de paraquedistas  fechava a coluna que, de Carmona, a capital do Uíge, arrancou para Luanda a 4 de Agosto de 1975. Logo, não poderia deixar ninguém para trás. Era essa a sua missão.
A missão dos grupos militares, aliás, estava perfeitamente definida: Companhia de Comandos a abrir e Companhia de Paraquedistas a fechar. A 2ª. e a 3ª. Companhias do BCAV. 8423 foram estrategicamente distribuídas pela coluna. 
O comando pertencia ao comandante do BCAV. 8423, tenente coronel Almeida e Brito, e, certamente, dada a envergadura e sensibilidade da operação em curso, a coordenação foi eficaz, pois chegámos todos a bom porto. 
Julgo que não devemos misturar o que se passou na cidade, em Carmona - eu também retenho algumas imagens menos próprias... -, com o decurso da operação Carmona/Luanda.
Operação cheia de riscos, muitas contrariedades, mas resolvida com êxito. 
E quero aqui frisar que qualquer negociação, se é que assim podemos designar os diálogos que aconteceram ao longo do percurso e com as várias forças dos movimentos, tiveram sempre a intervenção do Comandante do BCAV. 8423, comandante e responsável pela coluna. A última decisão seria sempre sua.
Todos sabemos em que mares navegavam as forças militares, na altura. Mas este Batalhão de Cavalaria - o 8423, os Cavaleiros do Norte! - graças a um brilhante exercício de Comando, manteve-se sempre coeso e disciplinado e, consequentemente, firme e hirto. 
Deu provas disso no terreno. 
Mesmo nos momentos em que se esqueceram que aquela força militar se encontrava no norte de Angola.
ANTÓNIO A. GUEDES
Furriel miliciano da 2ª. CCAV. 8423

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

1 757 - UNITA e FNLA para fora de Luanda


Capa do Diário de Lisboa de 9 de Agosto de 1975

Luanda, a 9 de Agosto de 1975, acordou com «violento tiroteio de armas ligeiras e pesadas, à medida que se generalizava uma ofensiva desencadeada pelo MPLA, com intenção de desalojar os últimos militares e políticos da FNLA, que se encontravam instalados no luxuoso Bairro do Saneamento, por detrás do Palácio do Governo».
O bairro era, recordo da leitura do Diário de Lisboa desse dia, que cito, «o último reduto da FNLA na cidade», com o Forte de S. Pedro da Barra. Na véspera, para Lisboa, partira Paulo Jorge, do MPLA, para «manifestar desagrado pela presença da FNLA no Governo de Transição» - aliás, «um Governo inoperante», como era reconhecido pelo Alto-Comissário Interino, general Ferreira de Macedo - a substituir Silva Cardoso, chamado a Lisboa.
O mesmo dia 9 de Agosto, há precisamente 38 anos, era tempo para «a retirada total das forças da UNITA, que se dirigiram para o Lobito e Nova Lisboa». Em Luanda, ficaram apenas os seus dirigentes políticos. 
Ao tempo, e leio agora no Livro da Unidade, os Cavaleiros do Norte, estacionados no Grafanil, estavam como «unidade de reserva da RMA», depois de «um curto período de repouso, o arranjo de viaturas e ocupar de novas instalações».
Um das suas raras intervenções terá sido no Bairro do Saneamento, onde «acudiu» a uma companhia portuguesa, recém-chegada de Lisboa e entalada entre fogos do MPLA e da FNLA. Uma estreia marcante para estes homens. De tal forma, que completo o batalhão, quiseram de imediato regressar a Portugal. Mas por lá ficaram, julgo que até à independência.

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

1 756 - Os dias de Agosto dos Cavaleiros do Norte...

Luanda à noite, em foto de Jorge Oliveira (1974). Notícia do Diário de Lisboa, sobre a Luanda de 8 de Agosto de 1975



A 7 de Agosto de 1975, forças do MPLA expulsaram 300 militantes da FNLA de Luanda. «Foram neutralizados e evacuados», noticiava a Reuter, citando Iko Carreira, membro da Junta Política do movimento liderado por Agostinho Neto.
Os «fnla´s», segundo Iko Careira, que falava em Brazaville, «tinham sido introduzidos na capital angolana com o objectivo de ocuparem o poder, pela força, iniciando essa operação com o domínio de pontos estratégicos». Mas, sublinhava o dirigente do MPLA, «a tomada eventual da capital, por soldados da FNLA, como anuncia determinada imprensa, não se registará, porque nós vamos opor ao invasor a resistência popular generalizada».
Era nesta Luanda que os Cavaleiros do Norte faziam o seu dia-a-dia, restringidos ao espaço que fora do Batalhão de Intendência, no Grafanil, vindos do ferro e fogo de Carmona e do Uíge. Uíge e Zaire, províncias do norte de Angola, que, disse Iko Carreira na mesma conferência de imprensa em Brazaville, «foram invadidas por forças da FNLA».  
Por mim, nos tempos livres das obrigações militares, folgava e procurava familiares e amigos na imensa capital angolana. Ora nas suas residências, ora no aeroporto - quando nelas não os encontrava. Desses (não) achamentos ia dando conta, por aerograma, a minha mãe - que fazia de intermediária dos familiares que, em Portugal, deles queriam notícias. Não eram fáceis as comunicações daquele tempo. Nada que tenha a ver com o que hoje é instantâneo, desde que tenhamos um telemóvel na mão.