Tenente Mora e furriéis Neto e Viegas
na avenida (rua de baixo) do Quitexe, em 1974
Ontem, foi dia de eu e o Neto darmos ao dente e à palavra, e à saudade!!!..., com o Quitexe na ementa e um mar de histórias na sobremesa. Veio à baila, o impagável tenente Mora, de quem podíamos contar mil e uma histórias, mas que deixaremos para outro tempo. Recordou o Neto uma ida dele à sanzala do Canzenza, a convite do Bernardo, que era chefe de GE´s e homem de fartas farras.
O Neto lá foi e, entre cerveja refrescada no frigorífico a petróleo, umas marufadas das boas e moambada de galinha, por lá se entreve, pela noite dentro mas sempre de olho desconfiado num grupo de homens, que por ali andavam no adro da sanzala e por nada, e nunca, se aproximavam da quitanga do Bernardo.
A noite foi crescendo, mais acalorada pelos vapores do marufo e as garfadas da moamba carregada de piri-piri, enquanto, por ali, se saracoteavam jovens meio desnudas, bombaleando o corpo em ritmos sensuais e despreconceituados.
Chegou o tempo do «vou embora que são horas» e despediu-se o Neto, curioso, todavia, por saber quem eram aqueles homens negros e de olhar desconfiado. «Quem são aqueles?!...», perguntou ele ao Bernardo.
«Eh, não sabes esfurrié...., são esturras, pá!...», disse-lhe o Bernardo, rasgando sorriso farto, nos lábios grossos que lhe desenhavam a boca.
O Neto fixou-os melhor e voltou a ouvir o Bernardo: «Tavam a ver se és gajo porêro, pá!!!...». E voltou a rir-se, como quem dizia para estar o Neto descansado.
Sabíamos nós que era vulgar os «turras» dormirem nas sanzalas, nas cubatas da família, e até de frequentarem cafés, bares e restaurantes do Quitexe. Saber, sabíamos..., ou meramente desconfiávamos, mas ali era estar em frente a eles. A diferença principal, porém, era o... apelido do furriel, que era (e é) Neto, como o líder (Agostinho) do MPLA. E nós estávamos em terra da FNLA, onde falar de Neto não era a coisa mais saudável e pacífica.
O Neto, furriel das FAP, lá veio embora, sem problemas, mas a pensar como um simples apelido pode atrapalhar quem o tem, em terra de guerra e onde rivalidades eram muitas vezes medidas a tiro.
- FAP. Forças Armadas Portuguesas.
- GE. Grupos Especiais. Força para-militar, formada por voluntários civis, ao serviço das FAP.
- BERNARDO. Chefe de um dos Grupos de GE do
Quitexe, dependentes do BCAV. 8423.
- TURRAS. Forma abreviada de terroristas, como
eram apelidados os homens armados dos movimentos de libertação.
Amigo Viegas.
ResponderEliminarObrigado por contares esta realidade,e para mim foi uma noite de receio mas tambem de valentia.
Tenho comigo cracha dos GE a prova viva como trabalhei com este chefe Bernardo e ao mesmo tempo informador do FNLA.Homem sabedor.
Francisco Neto.